Políticas públicas: Estudo da FGV-SP calculou efeito de mudanças no ICMS no preço final de dez alimentos
Valor Econômico, 21/12/2009Em tempos de crise, são comuns políticas públicas que reduzem impostos, como forma de aumentar a demanda e aquecer a economia. Em 2009, o governo federal reduziu alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para automóveis e linha branca. Nem sempre, porém, a queda nas alíquotas tributárias beneficia integralmente o consumidor final. Quando não há competição perfeita, a indústria ou o varejo podem aproveitar a redução para recompor parte de suas margens.
Essa é a conclusão de um estudo realizado pela Escola de Economia da Fundação Getulio Vargas de São Paulo (FGV-SP). A pesquisa analisou quanto das alterações de alíquotas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) chega a ser transmitido ao preço cobrado do consumidor final. Foram analisados os efeitos das variações do imposto em dez itens da cesta básica entre junho de 1994 e junho do ano passado. Em sete dos dez bens pesquisados o índice de transmissão variou de 22% a 50%, em média. Ou seja, de cada R$ 1 de redução de ICMS resultante da alteração tributária, apenas R$ 0,22 a R$ 0,50 chegaram a ser repassados, em média, ao preço ao consumidor final. Em três produtos, nenhum centavo de redução chegou ao preço final.
No açúcar, por exemplo, a cada R$ 1 de queda do imposto resultante de alteração tributária, apenas 47%, em média, foram repassados ao preço final. No arroz foram 43%. No óleo, 22%. Na carne e farinha, a transmissão foi zero.
De autoria dos pesquisadores Enlinson Henrique Carvalho de Mattos e Ricardo Politi, o estudo buscou verificar o impacto das reduções e elevações do imposto estadual sobre o preço final. No período analisado, porém, 70% das alterações tributárias geraram redução do imposto. Mattos explica que o período foi escolhido porque a partir de 1992 o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) permitiu que os Estados passassem a reduzir a base de cálculo do ICMS nas vendas internas de produtos da cesta básica. Isso ocasionou diversas alterações na carga tributária do imposto.
A pesquisa também levou em consideração especificidades do ICMS, como sua forma de recolhimento não cumulativo e sua apuração, que leva em consideração a inclusão do próprio imposto na base de cálculo.
"Conclui-se que o benefício de desoneração dos bens da cesta básica não atingiu os consumidores na mesma proporção", diz Mattos. Para ele, o impacto diferenciado nos preços sugere que os mercados não apresentam competição perfeita e a indústria ou varejo podem ter aproveitado a redução de ICMS para recompor parte de suas margens.
Os produtos pesquisados foram açúcar, arroz, café, carne, farinha, feijão, leite, manteiga, óleo e pão. Mattos lembra que os resultados para carne, leite e pão são afetados por grande número de varejistas que usam o Simples Nacional, sistema de pagamento de tributos destinado a pequenas empresas. Por isso, estabelecimentos como açougues e padarias recolhem os tributos de forma unificado. Para esses produtos, portanto, a pesquisa captou o efeito do ICMS para grandes estabelecimentos como supermercados e hipermercados. Há alguns segmentos também com elevada informalidade, aponta Mattos, como o de carnes.
Foram analisados preços de 16 capitais do país - Aracaju, Belém, Belo Horizonte, Brasília, Curitiba, Florianópolis, Fortaleza, Goiânia, João Pessoa, Natal, Porto Alegre, Recife, Rio, Salvador, São Paulo e Vitória. O estudo controlou custos locais, preços das matérias-primas, entre outras variáveis, além da repercussão de tributos federais na carga tributária de ICMS.
Para Mattos, o fato de a transmissão da redução de impostos não ser integral ao consumidor final é significativo para políticas publicas. "Em mercados com concorrência imperfeita, outros mecanismos devem ser considerados", sugere o professor.
Desde abril, alguns produtos beneficiados pela desoneração de IPI tiveram seus preços reduzidos. Entre abril e novembro, o preço médio da geladeira recuou 8,02% dentro do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Na mesma comparação, contudo, o preço dos fornos de micro-ondas, produto de linha branca não beneficiado com a redução de IPI, ficou 5,51% menor.
Júlio de Oliveira, tributarista do
Machado Associados , acredita que vários fatores podem ter influenciado a falta de transmissão integral da redução de ICMS. "Mercadorias que passam por muitas etapas de produção e comercialização, por exemplo, correm mais riscos de ter parte da desoneração perdida e agregada às margens de lucro das empresas", diz. Muitas vezes, acredita, indústrias e varejistas também podem deixar de repassar o benefício porque, em períodos passados, por questões de mercado, acabaram arcando com elevação de custos tributários.
Comentário: mesmo na teoria neoclássica, que considera concorrência perfeita, não há previsão de que toda a redução do imposto vá para os preços, os autores se esqueceram da tal elasticidade demanda-preço. Na vida real sabemos que não existe concorrência perfeita e o poder de mercado de alguns produtores ou distribuidores geralmente faz com que este embolsem o que antes era pago como imposto.
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