segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Juros são responsáveis pelo crescimento da dívida pública

Juros são responsáveis pela dívida
Estadão 25/10/2007


Desde o mês de janeiro deste ano a dívida pública federal ficou sob o controle do Tesouro, enquanto, anteriormente, dependia também do Banco Central (BC). Se essa concentração parece justificada, pode-se lamentar que tenha reduzido a responsabilidade do BC nas emissões de títulos da dívida pública mobiliária federal interna (DPMFi).

Em setembro, o estoque da Dívida Pública Federal (DPF) atingiu R$ 1,315 trilhão, acusando um crescimento de R$ 78,97 bilhões nos nove primeiros meses do ano. Esse aumento não foi produzido pelo déficit nominal do Tesouro no período, mas, essencialmente, pela apropriação dos juros, da ordem de R$ 72,5 bilhões, respondendo, portanto, por 91,8% do crescimento do estoque da dívida.

O valor dos juros pagos depende de vários fatores, como a taxa cambial e a evolução dos índices de preços, mas, principalmente, da taxa Selic fixada pelo Comitê de Política Monetária (Copom), que favorece as operações de arbitragem e é em parte responsável pela apreciação da moeda nacional em razão da entrada de capital especulativo.

O que se constata é que a atuação do Copom contribui para o aumento constante da DPMFi, cujo nível, por sua vez, representa um fator negativo na avaliação internacional. Uma redução dos juros pagos permitiria ao governo dispor de recursos importantes, aumentar os investimentos em infra-estrutura e reduzir a carga tributária.

Em setembro, houve uma melhora da DPMFi, com o recuo de 34,09% para 33,125% dos papéis a vencer em até 12 meses, e um aumento da parcela da dívida com vencimento acima de cinco anos, que passou de 12,18% para 13,46% - detalhes importantes numa fase de perturbação no mercado internacional, que é o mais interessado nesses papéis de prazo longo.

Em setembro, o custo médio da DPMFi, acumulado em 12 meses, caiu de 13,45% para 13,16%: a valorização do real em relação ao dólar e à taxa Selic explica essa evolução.

O Tesouro continua satisfeito com o aumento da colocação de títulos prefixados (LFT), que representaram 44% das vendas recentes.

Trata-se de um título cuja remuneração é alta, embora com a vantagem de não apresentar a volatilidade das outras taxas. Mas continuamos achando que, num contexto melhor da economia, mais adiante valeria a pena o Tesouro examinar se realmente deve continuar dando prioridade a esse título de curto prazo.

domingo, 28 de outubro de 2007

Facetas da reestatização

Paulo Renato (PSDB) critica atuação do Branco do Brasil. Tirem suas conclusões.

Quem encomendou o artigo do ilustre deputado foi o Bradesco. Na sua esperteza plena, ao mandar o artigo para a avaliação do Cypriano acabou enviando uma cópia para a Folha de São Paulo. A Folha publicou a gafe. Em vista disso, o Paulo Renato entregou o artigo para o Estadão.

--------------------------------------------------

Facetas da reestatização

Paulo Renato Souza

Estadão 28/10/2007

O governo Lula mais uma vez oferece sinais contraditórios na política econômica. De um lado, há movimentos inequívocos que visam à reestatização de vários setores da economia. Nos últimos meses constatamos iniciativas concretas nessa direção e um balão-de-ensaio - este último, a frustrada tentativa de criar um fato político com o chamado plebiscito sobre a reestatização da Vale do Rio Doce e que foi objeto de meu último artigo neste mesmo espaço. De outro lado, rende-se mais uma vez à realidade e promove o leilão de concessões de rodovias ao setor privado e anuncia outras ações semelhantes de privatizações na área de infra-estrutura.

As iniciativas concretas de reestatização já se observaram em alguns setores e, mais recentemente, no sistema financeiro. Neste campo, o governo anunciou que o Banco do Estado de Santa Catarina será entregue ao Banco do Brasil, ao arrepio da legislação vigente.

A possibilidade de federalização de um banco estadual não foi prevista quando da edição do Programa de Estímulo à Redução da Participação Estadual no Setor Financeiro (Proes), a partir da Medida Provisória (MP) 1.514, de 1996, posteriormente convertida na MP 2.192, de 2001. Esse programa fixou regras claras, pautadas pelos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, previstos no artigo 37 da Constituição. Essa legislação determina explicitamente que a desmobilização de ativos financeiros pertencentes ao setor público deve ser feita somente por meio de ofertas públicas e dos conseqüentes leilões, “assegurada a igualdade de condições a todos os concorrentes”. Segundo a lei, a União pode assumir o controle de uma instituição financeira estadual “exclusivamente para privatizá-la ou extingui-la”.

A expansão estatal no setor financeiro se observa também nas ações para assumir as folhas de pagamento de vários Estados. O Banco do Brasil vem oferecendo como contrapartida a aplicação nos respectivos territórios de linhas de crédito que só ele detém, por força das suas funções de agente financeiro do governo. Tais linhas estarão à disposição somente dos Estados afinados com a estratégia de expansão do banco sob controle do governo federal, com nítida ofensa às regras concorrenciais.

A atuação do Estado brasileiro no setor financeiro tem raízes históricas muito importantes. O Banco do Brasil cumpre algumas funções que dificilmente seriam atendidas pela rede bancária privada. A presença territorial do banco, atendendo a pequenas cidades, seguramente é uma delas. Não se contam entre elas, contudo, a prestação de determinados serviços que podem ser oferecidos, inclusive com mais eficiência, pelo setor privado.

Nossa Constituição consagra a livre iniciativa, restringindo a intervenção direta do Estado na economia como agente produtor apenas para situações extraordinárias. A grande presença estatal na economia nacional tinha raízes históricas muito anteriores à vigência da atual Carta Magna. O esforço para levar adiante o processo de privatizações no Brasil se iniciou nos anos 1990. Na época se discutia a ineficiência da gestão pública em alguns setores e o enorme peso orçamentário e financeiro que o governo tinha de suportar em razão dos déficits constantes e da necessidade de canalizar recursos fiscais para o investimento nas estatais. Numa outra visão, o programa de governo do então candidato Fernando Henrique Cardoso às eleições presidenciais de 1994 outorgou papel central às privatizações como uma das fontes de recursos para financiar os investimentos públicos.

Todo o processo de privatização se deu ao abrigo de legislação específica na defesa do interesse público e segundo princípios e práticas transparentes. É inquestionável o seu retumbante êxito, tanto na arrecadação de recursos para o Estado quanto na melhoria da produção, do emprego e da produtividade nas empresas privatizadas. Ênfase especial deve ser dada ao ocorrido nos setores de telefonia, siderurgia, mineração e produção de aeronaves. Além dos enormes ganhos econômicos e sociais para o País, evitaram barganhas políticas no loteamento de centenas de cargos de direção nas empresas privatizadas. Lembremo-nos de que apenas na telefonia havia 27 empresas de âmbito estadual pertencentes ao chamado Sistema Telebrás.

O primeiro ano do governo Lula, em 2003, foi consumido com ações para demonstrar que ele cumpriria os contratos e ajustes anteriormente fixados. Foi um esforço louvável e reconhecido amplamente pela sociedade brasileira e pela comunidade internacional. Já no primeiro ano do seu segundo mandato, o presidente lançou o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), para o qual esse histórico anterior lhe permitiria pedir a participação de agentes privados em projetos de longo prazo, em parceria com o Estado.

Para manter essa credibilidade será necessário, entretanto, conter no governo, em órgãos públicos e empresas estatais o ímpeto de agentes que julgam ser um mero detalhe o cumprimento da legislação e de obrigações e contratos. É estranho que, em boa parte desses eventos de reestatização, a iniciativa tenha partido de empresas públicas ou de economia mista, mobilizando o governo e mesmo órgãos reguladores para abocanhar fatias do mercado. Se existe a intenção de reestatizar setores da economia, é preciso submeter essa decisão ao Congresso e mudar a legislação hoje vigente no País. Sem a garantia do cumprimento da Constituição federal e das leis será inútil exibir índices positivos na economia brasileira para captar recursos e financiar projetos públicos.

Paulo Renato Souza, deputado federal por São Paulo, foi ministro da Educação no
governo Fernando Henrique Cardoso, reitor da Unicamp e secretário de Educação
no governo Montoro. E-mail: dep.paulorenatosouza@ camara.gov.br.
Site: www.paulorenatosouza.com.br


terça-feira, 23 de outubro de 2007

Habemus juros

A carga tributária cresceu na última década porque as despesas com juros cresceram demasiadamente

Poderia haver regra para limitar quanto o governo poderia gastar na rubrica despesas de juros


JOÃO SICSÚ
diretor do Ipea

Folha de São Paulo 21/10/2007

Diretor do Ipea defende limite de gastos com juros

Para João Sicsú, despesas do governo com o pagamento de juros da dívida pública não geram empregos nem bem-estar

Com a taxa de câmbio valorizada, economista alerta para o risco de déficit em transações correntes no próximo ano

PEDRO SOARES
Folha de São Paulo 21/10/2007

Tido como desenvolvimentista entre os economistas do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), João Sicsú, novo diretor de Estudos Macroeconômicos do órgão, afirma que a economia vai bem, mas existem duas fragilidades: a taxa de juros ainda é muito alta, e a taxa de câmbio está demasiadamente valorizada.

FOLHA - Como o sr. avalia a questão do aumento de gastos públicos? O que acha da regra de limitá-los?
JOÃO SICSÚ
- Gastos de um governo devem ser analisados pelos benefícios que podem gerar. Gastos de custeio, capital, pessoal e previdenciários geram benefícios para a sociedade, geram empregos e bem-estar social. Há gastos que não geram empregos nem bem-estar.
Um exemplo é o gasto do governo com o pagamento de juros referentes à dívida pública. Quem recebe essa transferência, em geral, não transforma essa renda em gastos de consumo ou investimento. Normalmente, compram mais títulos da dívida. Por outro lado, quem recebe o Bolsa Família transforma a sua renda adicional em gasto de consumo, o que reduz a insatisfação e gera empregos.
Acho que poderia haver uma regra que deveria limitar quanto o governo poderia gastar na rubrica despesas de juros: o governo gastou cerca de, entre 2003 e 2006, R$ 600 bilhões. Essa despesa não gera empregos nem bem-estar.

FOLHA - Uma política de aumento real expressivo do salário mínimo não é contraditória com a necessidade de conter gastos especialmente por causa do impacto nos benefícios previdenciários?
SICSÚ
- O aumento do salário mínimo é um mecanismo potente de prevenção e redução da pobreza, usado em economias desenvolvidas, como um dos pilares da política social. Assim, como a busca do equilíbrio do Orçamento da União não deve utilizar critérios exclusivamente contábeis, o equilíbrio orçamentário da Previdência Social não é um problema a ser resolvido com critérios meramente atuariais.

FOLHA - O que o país precisa fazer para acelerar o crescimento econômico? O país não precisa de um choque de gestão?
SICSÚ
- A inflação está controlada e a economia está crescendo a um ritmo considerado muito bom, quando comparado com o que ocorreu nas últimas duas décadas. Entretanto, a economia não está totalmente estabilizada. Variáveis estratégicas ainda estão fora do lugar. A taxa de juros ainda é muito alta e a taxa de câmbio está demasiadamente valorizada. Em 2008, perderemos provavelmente o saldo positivo em transações correntes, se o câmbio permanecer valorizado e a economia continuar crescendo.
Essa é uma fragilidade importante no front externo, mas temos, para compensar, um volume considerável de reservas, uma dívida externa bastante reduzida e a entrada de investimento direto estrangeiro. Uma segunda fase ainda mais vigorosa do PAC é o que o país precisa para fazer um longo ciclo de crescimento.

FOLHA - Quais reformas econômicas ainda precisam ser conduzidas e quais propostas o sr. tem para elas?
SICSÚ
- No campo da economia, a principal reforma que o país precisa é a tributária. A carga tributária no Brasil cresceu na última década porque as despesas públicas com juros cresceram demasiadamente, apesar das privatizações dos anos 1990 que foram justificadas, porque seriam utilizadas para reduzir a dívida pública.
O ponto é que temos a carga tributária elevada, porque praticamos juros elevados. Uma carga elevada, em tese, não necessariamente deve ser considerada negativa. A brasileira deve ser considerada negativa porque ela é "no-delivery': não entrega o que foi prometido na Constituição de 1988.

segunda-feira, 22 de outubro de 2007

Henrique Meirelles: O melhor presidente do Banco Central de todos os tempos

Os títulos públicos estão rendendo o dobro para o "investidor" estrangeiro. Vejam só:
Com queda do dólar e isenção de IR, aplicação de investidor externo dá ganho de 89% desde fevereiro de 2006 (o estrangeiro embolsa também a valorização cambial). Se aplicassem em títulos do tesouro norte-americano levariam uns 15 anos para ganhar o mesmo.

Esta conta foi feita com base nos títulos de longo prazo atrelados ao IPCA, os mais procurados pelos estrangeiros. Estes títulos rendem a variação do IPCA mais uma polpuda taxa prefixada. Quando há expectativa de queda na taxa de juros esses papéis valorizam, foi o que ocorreu no período.
Um investidor brasileiro no mesmo período ganhou "apenas" 42% (já descontado o IR).

Em 2006, investimentos estrangeiros em títulos públicos somaram US$ 11 bi; neste ano, até agosto, fluxo era de US$ 14 bi. São capitais de curto prazo que vêm para o Brasil ganhar com arbitragem de juros.

O país não ganha nada com isso, ao contrário, o dinheiro dos impostos pagos pela sociedade ao invés de ser gasto com a população carente de serviços vai para o bolso da elite financeira nacional e internacional.

O marquetólogo, os juros e a área

JOÃO SICSÚ

O marquetólogo, os juros e a área

O marquetólogo pensa que fiscais da Receita ficam em escritórios refrigerados só analisando declarações de IR

Folha de São Paulo 20/10/2007

MARQUETÓLOGO é o estudioso das teorias de marketing. Mas também podemos atribuir ao termo outro significado: ideólogo a serviço dos ganhos exorbitantes do mercado financeiro. Os marquetólogos tiveram boa formação acadêmica. Mas marquetólogo é aquele que já abandonou critérios científicos de abordagem da realidade, é apenas um crente, é uma "caixa de som" portadora de idéias que nem sabe sequer a origem. O mercado financeiro não contrata apenas marquetólogos. Sérgio Werlang é um exemplo de um cientista a serviço de um grande banco.
Os marquetólogos têm idéias muito simples: 1) superávits primários fiscais e juros devem ser altos porque garantem ganhos seguros e elevados para os seus patrões e clientes e 2) o nanico Estado brasileiro é considerado culpado por todos os males da economia. Eles não percebem que o Estado não gera bem-estar social porque, acima de tudo, não tem um quantitativo de funcionários capaz de atender aos milhões de brasileiros carentes de serviços, por exemplo, de educação e saúde de boa qualidade.
Um desses marquetólogos me criticou, em artigo publicado na Folha, por ter usado como proxi para mensurar o nanismo do Estado brasileiro a quantidade de fiscais por 1.000 km2 relativamente a Bélgica, Japão, Holanda e outros países. Quando apresentei os dados, já esperava que tal crítica fosse feita. Mas, como a crítica demorou a aparecer, avaliei que tivesse subestimado a inteligência dos marquetólogos de plantão. Porém a crítica veio: não subestimei.
Segundo o Unafisco -Sindicato Nacional dos Fiscais da Receita Federal- e o estudo da OCDE que mencionei como fonte dos dados que havia apresentado, é reconhecido que a quantidade de fiscais da receita pública deve ser avaliada por duas dimensões:1) pelo tamanho do território/fronteiras e 2) pelo total de habitantes de um país.
A primeira dimensão, desprezada pelo marquetólogo, é muito importante, porque os fiscais da Receita Federal têm o dever de combater contrabando e atividades econômicas ilícitas, tal como a pirataria. O contrabando pode passar por fronteiras abandonadas. As mercadorias piratas podem ser produzidas em qualquer recanto do vasto território nacional. Cabe esclarecer, inclusive, que está escrito na carteira funcional dos fiscais da Receita Federal que estão autorizados a utilizar arma de fogo porque sua tarefa é fiscalizar regiões perigosas e desertas. O marquetólogo pensa que fiscais da Receita ficam dentro de escritórios refrigerados analisando declarações de Imposto de Renda.
É também um critério importante a ser levado em conta a relação entre a quantidade de fiscais e a quantidade de habitantes de um país. Pelo critério espacial, o Estado brasileiro é nanico. Pelo critério populacional também. O Brasil possui 0,04 fiscal por mil habitantes. A Bélgica possui 0,32, a Holanda, 0,58, e o Japão 0,30.
De fato, o Brasil precisa não somente de fiscais; precisa também contratar por concurso público para receber salários dignos: professores, médicos, enfermeiros, policiais, engenheiros e pesquisadores.
O marquetólogo tratou de um tema que desconhece. Deveria ter criticado é o Banco Central, onde foi diretor. Ele sabe como as coisas são decididas nessa instituição. Será que o Banco Central utilizou como base o tamanho continental do território nacional para manter a elevadíssima taxa Selic em 11,25% na sua última reunião? Talvez essa seja a explicação absurda que sustente a decisão absurda.


JOÃO SICSÚ é diretor de Estudos Macroeconômicos do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e professor do Instituto de Economia da UFRJ. É autor do livro "Emprego, Juros e Câmbio" (Campus-Elsevier, 2007) e co-autor e organizador do livro "Arrecadação (de onde vem?) e Gastos Públicos (para onde vão?)", Boitempo Editorial, 2007.

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

A turma da bufunfa comemora

Por unanimidade, o COPOM decidiu manter a taxa de juros em 11,25%. Segundo eles, os pobres e miseráveis do Brasil estão comendo demais. Á uma explosão de demanda.

Nenhum analista minimamente sério tem coragem de dizer que há uma expansão excessiva da demanda. Pelos números do IBGE vemos que o crescimento do PIB é puxado pelos investimentos, que significam capacidade produtiva para atender a demanda futura.

Se a situação dos mais pobres está melhorando um pouquinho (bolsa família e aumento real do salário mínimo), é claro que o consumo vai crescer, é isso que faz a economia movimentar. Alguém investe hoje pensando que no futuro haverá renda para compra a sua produção. Para a direção do COPOM (escolhida a dedo pelos grandes players do mercado financeiro) qualquer avanço na renda é desculpa para manter os juros altos.

terça-feira, 16 de outubro de 2007

Huck x Ferrez

Gritos e resmungos
Nas últimas semanas, os debates suscitados pela controvérsia Huck-Ferrez desataram um desfile de fúria e descontrole moral.
(...)
A generosa distribuição de adjetivos foi acompanhada de exaltadas conclamações para o retorno dos militares ou sugestões para que os correrias de Ferréz fossem mais eficientes em seu "empreendedorismo" anárquico e, não raro, mortal.
(...)
Torço para que o destampatório seja mais um esgar do que um ideário consistente. Mas não custa ficar esperto: os estudiosos do totalitarismo sabem que a "autovitimização" da "boa sociedade" e a inculpação do "outro" foram métodos eficientes para a conquista do poder absoluto.

Vejo nos blogs: os mais furiosos se apresentam como "humanos direitos", em contraposição aos defensores dos "direitos humanos". Fico a imaginar como seria a vida dos humanos direitos na moderna sociedade capitalista de massas, crivada de conflitos e contradições, sem instituições que garantam os direitos civis, sociais e econômicos conquistados a duras penas. A possibilidade da realização desse pesadelo, um tropismo da anarquia de massas, tornaria o Gulag e o Holocausto um ensaio de amadores.

Hanna Arendt, em "Origens do Totalitarismo", abordou as transformações sociais e políticas na era do capitalismo tardio e da sociedade de massas. A economia dos monopólios promoveu a substituição empresa individual pela coletivização da propriedade privada e, ao mesmo tempo, a "individualização do trabalho" engendrada pelas novas modalidades tecnológicas e organizacionais da grande empresa. (...) A operação impessoal das forças econômicas produziu, em simultâneo, o declínio do homem público e a ascensão do "homem massa, cuja principal característica não é a brutalidade nem a rudeza, mas o seu isolamento e sua falta de relações sociais normais".

Trata-se da abolição do sentimento de pertinência a uma classe social sem a supressão das relações de dominação. (...)

Em seu último livro, "The Assault on Reason", misteriosamente não divulgado no Brasil, Al Gore, ganhador do Prêmio Nobel da Paz de 2007, diz que "Hanna Arendt escreveu sobre o totalitarismo no século XX e ressaltou a importância da esfera pública (onde se forma o consensus iuris): ' O único remédio contra o mau uso do poder público pelos indivíduos privados está na constituição de um espaço público capaz de avaliar os procedimentos de cada cidadão, submetendo todos os indivíduos à visibilidade'. Quando as opiniões são bloqueadas (pelo particularismo dos monopolistas da informação), a meritocracia das idéias sofre um grave dano e o debate democrático escapa às normas da razão e pode ser manipulado".


Luiz Gonzaga de Mello Belluzzo, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e professor titular do Instituto de Economia da Unicamp
Valor 16/10/2007

Proteção à indústria une emergentes

Brasil, Índia, África do Sul e outros emergentes preparam-se para propor corte menor de tarifas e aumento no número de setores industriais sensíveis na Rodada Doha. A Índia submeteu discretamente a seus principais parceiros um "esboço de proposta" que levaria o Brasil e outros emergentes a ter flexibilidade 50% maior para proteger sua indústria - de 10% para 15% das linhas tarifárias.

O texto industrial em negociação na OMC propõe uma redução tarifária entre 55% e 60% e flexibilidade para cortar menos em 10% das alíquotas. O documento da Índia segue a linha da mensagem a ser dada pelos líderes dos três países, que se reúnem amanhã em Pretória: continuam empenhados no sucesso da rodada, mas se recusam a fechar um acordo a qualquer custo.

Valor 16/10/2007

Petróleo fica acima de US$ 86 nos EUA e ultrapassa a cotação de 1981

O preço do barril de petróleo disparou nos principais mercados do mundo ontem. A alta foi tão forte que não só ultrapassou a barreira dos US$ 86, como também deixou para trás uma marca histórica conseguida ainda durante os anos subseqüentes ao segundo choque do petróleo. Ajustada pela inflação do período, a cotação de US$ 37,48 de março de 1981, uma das maiores do produto e fruto da decisão do Irã de suspender suas exportações, seria hoje de US$ 84,73.

Valor 16/10/07

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Remuneração do(a) professor(a) x qualidade do ensino

Em geral o salário inicial do professor da rede pública é muito baixo. Alguns estados pagam uma mixaria de salário base e adicionam uma remuneração extra dependendo da assiduidade e do desempenho. Esses "pinduricalhos" geralmente não acompanha a renda do professor na aposentadoria, nas férias ou quando adoece. Eu concordo que se avalie o professor e se recompense os mais esforçados. O que não se pode é fixar uma remuneração tão baixa que não atraia as melhores cabeças para área do ensino. Do jeito que está no Brasil, ser professor se torna uma opção quando não há mais outras.

Segundo a Folha de São Paulo (15/10/07), um professor do Acre ganha 39% a maior do que o de São Paulo (se considerarmos o custo de vida nos dois estados a diferença salaria vai a 60%).

"O baixo salário dos docentes é uma questão histórica no país. Basta ver o de outros países da América Latina, como Chile e Argentina, que são maiores", afirma Célio da Cunha, assessor especial da Unesco no Brasil. Para ele, o salário baixo é uma das explicações para a má qualidade do ensino. "Um salário justo motiva os professores."

O salário um pouco melhor no Acre começa a dar resultado. Prova disso pode ser a análise do Saeb (exame do MEC que avalia estudantes), divulgada em fevereiro. Na comparação entre 2003 e 2005, o Acre foi onde as médias dos alunos de 4ª série mais evoluíram. Em português, houve aumento de 13,8 pontos (de 156,2 para 170).

Se concordarmos que a educação é importante, também devemos concordar que um professor precisa ser bem remuredado.

Professor de SP ganha 39% menos que do AC

Professor de SP ganha 39% menos que do AC

Ranking dos salários de docentes da rede estadual em início de carreira traz SP, que tem o maior Orçamento entre os Estados, em 8º lugar

Se for levado em conta o custo de vida, a diferença entre São Paulo e Acre, que lidera a lista de melhores salários, aumenta para 60%

Greg Salibian/Folha Imagem
Luis Henrique da Costa, 45, professor da rede pública de SP; para ele, justo seria ganhar o dobro de seu salário atual, de R$ 2.500


DANIELA TÓFOLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Os professores em início de carreira da rede estadual paulista recebem salário 39% menor do que os do Acre. Enquanto um docente com formação superior e piso inicial de São Paulo ganha R$ 8,05 por hora, o colega acreano recebe R$ 13,16. Se levado em conta que o custo de vida lá é menor, a diferença aumenta para 60%.
O ranking dos salários do país mostra que o Acre lidera a lista dos Estados que pagam melhor seus professores em início de carreira, seguido por Roraima, Tocantins, Alagoas e Mato Grosso. São Paulo vem em oitavo lugar, apesar de ter o maior Orçamento do país. Pernambuco tem o pior salário.
A remuneração acreana, porém, ainda não é a ideal para especialistas. "O baixo salário dos docentes é uma questão histórica no país. Basta ver o de outros países da América Latina, como Chile e Argentina, que são maiores", afirma Célio da Cunha, assessor especial da Unesco no Brasil. Para ele, o salário baixo é uma das explicações para a má qualidade do ensino. "Um salário justo motiva os professores."
O salário um pouco melhor no Acre começa a dar resultado. Prova disso pode ser a análise do Saeb (exame do MEC que avalia estudantes), divulgada em fevereiro. Na comparação entre 2003 e 2005, o Acre foi onde as médias dos alunos de 4ª série mais evoluíram. Em português, houve aumento de 13,8 pontos (de 156,2 para 170). Já São Paulo melhorou 1,1 ponto (de 176,8 para 177,9).
"Um docente bem pago trabalha melhor, sem dúvida", diz a professora da Faculdade de Educação da USP Lisandre Maria Castello Branco. Para ela, os governos continuam mais preocupados em melhorar a estrutura das escolas do que em investir no docente.
No Acre, os professores se organizaram para pressionar o governo, que criou um plano de carreira. "Houve também uma reorganização que tirou docentes de funções burocráticas e os colocou na sala de aula, permitindo melhor uso dos recursos", diz Mark Clark Assem de Carvalho, da Universidade Federal do Acre. A maioria é formada no Estado e não há falta de docentes. Mas eles reclamam de salas lotadas.
Em São Paulo, a situação se agrava se levado em conta o custo de vida. Um professor que trabalha 120 horas por mês (30 por semana) tem salário de R$ 966 e consegue comprar 4,9 cestas básicas. Já o do Acre recebe R$ 1.580 e compra 12,6. Ou seja, a diferença do salário/ poder de compra chega a 60%.
Para comparação, a reportagem considerou a cesta básica de setembro. A paulista tinha 13 itens e custava R$ 194,34. A do Acre -com um item a mais, a carne de frango-, R$ 124,47.
A secretária de Educação da gestão José Serra (PSDB), Maria Helena Guimarães de Castro, não deu entrevista sobre o assunto. Sua assessoria pediu que fosse procurada a Secretaria de Gestão, responsável pelos salários dos docentes. Esta também não se pronunciou.
A única explicação dada pela Educação foi a de que, em São Paulo, os professores já iniciam a carreira recebendo gratificações. Mas no Acre, assim como em boa parte dos Estados, também é assim. Para calcular os salários por Estado, nenhuma gratificação foi contabilizada, pois a maioria pode ser cancelada e não é incorporada no cálculo da aposentadoria.
O levantamento considerou o piso inicial de um professor estadual com licenciatura plena (ensino superior). Conforme a CNTE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação), 25% dos docentes do país estão em início de carreira. Em São Paulo, segundo a secretaria, são 26%.
Os salários foram fornecidos pela CNTE, e a reportagem procurou todos os Estados para checar as informações. Dezessete retornaram o contato. Quatro tinham dados diferentes (BA, PE, PR e SP), que foram corrigidos para o cálculo.

Folha de São Paulo (15/10/2007)

domingo, 14 de outubro de 2007

A miséria no império

Nos últimos anos houve um grande aumento no abismo da desigualdade nos Estados Unidos. Os dados do censo de 2005 mostram que 16 milhões de cidadãos vivem "em profunda pobreza ou miséria". De 2000 a 2005, o número de pobres americanos cresceu 26%.

Dos 302 milhões de norte-americanos, 45 milhões não têm direito a nenhuma assistência médica pública.

O ensino vai à bolsa

Grupos privados abrem o capital no mercado e iniciam novo ciclo no setor, baseado em fusões, aquisições e na disputa por alunos de menor renda.

A estrela nessa onda é a Anhanguera Educacional que conseguiu captar R$512 milhões na bolsa de São Paulo. Mas no último exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) menos de 10% dos formandos no curso de direito do Centro Universitário Ibero-Americano, em São Paulo, e da Faculdade Comunitária de Campinas, escolas da rede Anhanguera, foram aprovados.

Os estudiosos ligados à educação estão muito preocupados com mercantilização da educação no Brasil. O que se vê hoje é um grande número de diplomados sem o respectivo conhecimento. Muitas famílias carentes gastam o que não podem na educação dos filhos sem saber que após a formatura seus filhos encontraram empregos na faixa de 2 salários mínimos.

A cabeça do brasileiro

O livro intitulado A Cabeça do Brasileiro, de Alberto Carlos de Almeida, baseia-se numa pesquisa destinada a mostrar que a "elite nacional é o farol da modernidade" enquanto o povo é responsável por todo atraso.

A elite inculta organizam um festival de besteiras e maior delas é dizer que a classe dominte é vítima da classe dominada. A turma que se acha portadora da modernidade lê Veja e Estadão e se acha extramemente culta, não exergam o obvio diante dos seus narizes. A cultura dessa turma em geral se resume a conhecer algumas pontos pitorescos na nossa história. Uma turma preconceituosa que fala mal dos desempregados como se estivessem nessa situação por opção, mas adora viver de juros e da especulação imobiliária.

A mentalidade de nossa elite é surreal.

sábado, 13 de outubro de 2007

O tucano Paulo Renato submete artigo criticando ação do BB ao presidente do Bradesco

Paulo Renato submete artigo a banco

Deputado do PSDB pede opinião do presidente do Bradesco sobre texto com críticas ao Banco do Brasil

Folha de São Paulo 10/10/07

O deputado federal Paulo Renato (PSDB-SP) submeteu à apreciação da presidência do banco Bradesco um texto assinado por ele e enviado anteontem à Folha para publicação. No artigo, ainda inédito, o deputado critica a intenção do governo federal de passar o Besc (Banco do Estado de Santa Catarina) para o controle do Banco do Brasil.
O texto foi enviado ao jornal por e-mail. Por engano, o corpo da mensagem trouxe uma correspondência eletrônica anterior, na qual o parlamentar escrevera ao presidente do Bradesco, Márcio Cypriano: "Em anexo, vai o artigo revisto. Procurei colocá-lo dentro dos limites do espaço da Folha. Por favor, veja se está correto e se você concorda, ou tem alguma observação. Muito obrigado, Paulo Renato Souza".
Ouvido ontem pela Folha, o presidente do Bradesco, Márcio Cypriano, afirmou: "O deputado Paulo Renato me ligou perguntando se eu poderia ler um artigo que ele tinha escrito sobre bancos. O receio dele era de o artigo ter algum erro, já que tinha muitas questões e termos técnicos. Eu disse que podia ler e ele me mandou o artigo. Eu achei bom o artigo. Muito bem escrito, por sinal. Foi só isso".
Intitulado "Tentáculos da reestatização", o texto foi enviado dois dias após o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ter participado, em Florianópolis (SC), de um evento no qual dirigentes do BB se comprometeram a incorporar o Besc, federalizado na década de 90.
No texto, o ex-ministro da Educação (1995-2002) Paulo Renato reclama da ausência de um processo licitatório para definir os novos donos do Besc. Ele também critica supostas estratégias que estariam sendo empregadas pelo BB para expandir seus negócios no território nacional, o que seria, segundo ele, uma "nítida ofensa às regras concorrenciais".
O deputado Paulo Renato disse ontem à reportagem que não mantém nem manteve contratos com o grupo Bradesco por meio de sua empresa de consultoria, a Paulo Renato Souza Consultores. Afirmou que buscava apenas uma opinião técnica sobre o assunto.
"Eu tinha encontrado com o Márcio num almoço, comentei com ele que iria fazer esse artigo e pedi ajuda para ele para ver se não estava dizendo uma barbaridade sobre os temas que eu estava tratando. E ele se dispôs a me ajudar", disse.
Indagado sobre o verbo que utilizou, ao perguntar a Cypriano se ele "concordava" com o texto, o parlamentar afirmou: "Se concorda com os argumentos que eu coloquei no artigo".
O parlamentar disse ter feito o mesmo em relação a um artigo que produziu sobre a companhia siderúrgica Vale do Rio Doce: "Eu escrevi um artigo sobre a Vale do Rio Doce comparando com a Petrobras. Eu pedi os dados, obviamente, para o pessoal da Vale. Mandei o artigo [à Vale] para ver se eu tinha interpretado direito os dados que ele tinha mandado. A mesma coisa fiz agora", afirmou.
"Em economia, tem que se ter cuidado, pois os conceitos podem não estar precisos", disse ele, que foi professor titular de economia da Unicamp.

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Aracruz investirá US$ 2 bi no Rio Grande do Sul

A diretoria da Aracruz, a maior fabricante de celulose de eucalipto do mundo, vai submeter ao seu conselho de administração, entre o fim deste ano e o início de 2008, seu projeto bilionário de expansão no Rio Grande do Sul. A empresa planeja investir US$ 2 bilhões entre gastos com terras e florestas, a fábrica e a infra-estrutura para ampliar a capacidade de produção da unidade de Guaíba em 1,3 milhão de toneladas de celulose. Com isso, a empresa produzirá 1,8 milhão de toneladas no Sul do Brasil.

É duro ver o Brasil apostando suas fichas no agronegócio. Nas áreas onde a Aracruz vai chegando a pequena propriedade desaparece mais rapidamente e muitos empregos no campo são destruídos. A monocultura de eucalipto ocupa terras apropriadas para produção de alimentos, trás ruína para alguns municípios pequenos, uma vez que favorece a concentração de renda.

terça-feira, 9 de outubro de 2007

Tropa de Elite

Depois de ter seu rolex roubado, o apresentador Luciano Huck em artigo na Folha clama pelo capitão Nascimento (personagem do filme Tropa de Elite). O policial-torturador do filme vira herói no pensamento conservador que predomina na mídia nacional.

Num país de miseráveis onde só 5% recebe mais de R$800 por mês, ostentar um rolex é nas ruas é algo surreal. Huck deveria agradecer por ter saído vivo e ileso, ao invés disso clama por mais dureza por parte da polícia. Como se esta já não fosse violenta!

De acordo com o Instituto de Segurança Pública do Rio, para cada policial morto em serviço no Estado, no primeiro semestre de 2006, 26 civis foram assassinados por homens de farda. No mesmo período de 2007, a relação aumentou de um para 40.

Os conservadores acham que apenas a repressão é a solução. Atacam as consequências e se esquecem das causas. Já ouvi falar que há países mais pobres onde que a violência é menor. Mais pobres sim, mais desiguais, eu duvido!

Que caminho tomaria um jovem que não tem acesso a uma escola decente? Que não consegue um emprego (as taxas de desemprego entre os jovens estão na casa dos 30%)? Filho de uma mãe que rala para ganhar uma miséria numa casa de madame e muitas vezes um pai desempregado?

A sociedade brasileira exclui milhões, como dizem os especialistas em economia do trabalho, são óleo queimado, não servem, não valem nada. Se a vida desse jovem não vale nada, o que impede de ele achar que a tua vida também não vale nada?

Por quê não oferecer uma escola pública de qualidade para todos? Os liberais deveriam defender igualdade de oportunidades. Mas educação de qualidade custa caro e a turma do andar de cima não abre mão dos polpudos juros proporcionados pela política econômica do governo Lula.

Che Guevara era fedido

Interessante a reportagem publicada na Veja da semana passada, onde "verdades inconvenientes" sobre Ernesto Che Guevara são reveladas.

Por exemplo: pessoas próximas a ele, ao Che, o chamavam de el cancho, o porco. Diziam que ele não gostava de tomar banho e, portanto, fedia.

Eu não sabia disso, mas, a partir de agora, passo a odiá-lo. Pelo que lutou e morreu, pouco importa. Como é que alguém pode querer mudar as coisas no mundo se nem ao menos cuida de sua higiene pessoal?

Em breve, o profundido jornalismo investigativo vai descobrir que Marx soltava pum de maneira incontrolável. Engels tinha mau hálito. Fidel tem um frieira crônica que adora coçar.


Seção Refogado (Márcio Alemão) da Carta Capital nr 465 de 10/10/07

segunda-feira, 8 de outubro de 2007

Pedágios, mais pedágios

A Federação dos transportes de Cargas do Estado de Santa Catarina (Fetrancesc) descobriu em documentos oficiais da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) com logotipo de empreiteiras. Essas notícia foi destaque nas páginas de Carta Capital poucos dias antes do leilão de vários trechos de rodovias federais.

Esse leilão vinha sendo adiado há alguns anos por causa do formato da licitação. O modelo montado pela Casa Civil buscou equacionar o menor custo para o usuário da rodovia. Nesse formato a concessionária assume o compromisso de realizar uma série de investimentos na manutenção e melhoria da estrada. Ganha quem cobrar a menor tarifa de pedágio.

Esse modelo é muito superior ao utilizado nas privatizações de rodovias federais na gestão FHC e em muitos estados, onde ganhou quem pagou mais pela concessão. Nesse caso o usuário pagou duas vezes, uma pela construção da rodovia (impostos) e outra ao utilizar.

Houveram absurdos, tarifas altíssimas. Segundo Cloraldino Severo1, "Estabelecem-se monopólios, os usuários não têm alternativas. Há pedágios em pistas simples. O usuário paga por obras que estão imaginadas." Por exemplo, de Campinas a São Paulo, trecho com menos de 100km se paga R$21 (ida e volta), multiplicando a tarifa muito alta e o volume elevado de veículos fazem esse trecho um dos mais rentáveis do país irrigando o bolso de concessionárias e empreiteiras (elas andam juntas, muitas vezes são sócias da concessionária).

Só para ter uma idéia, nos EUA são 7.150 km de concessões para uma malha pavimentada total 5 milhões de km. Na França são cerca de 6 mil km geridas por 9 empresas, sendo que 8 delas são públicas e controlam mais de 80% da extensao com cobranca de pedágio. No Brasil há 10.825 km de estradas com pedágio num malha total de 85 mil km de estradas pavimentadas.

Na última terça (09/10/07) o Governo Federal colocou à venda concessões de 25 anos para a exploração de sete trechos de rodovias federais, num total de 2.600 quilômetros. A grande novidade foi o deságio em relação preço inicial muito maior que o esperado. Ainda não há data definida para o início da cobrança.

A Fernão Dias que liga Belo Horizonte a São Paulo terá 8 pedágios a R$0,997 cada (deságio de 65% em relação ao preço inicial). A Regis Bittencourt terá 6 pedágios a R$ 1,364 (deságio de 49%). Curitiba-Florianópolis terá 7 praças de pedágio (R$ 1,028).

A BR-101 da divisa ES/RJ até a ponte Rio-Niterói terá 5 praças a R$ 2,258 (deságio de 41%). A Transbrasiliana (BR-153) terá tarifa de R$ 2,45.

O trecho da BR-116 Sul, entre Curitiba e a divisa de Santa Catarina com o Rio Grande do Sul terá pedágio de R$ 2,54, com deságio de 39,35% em relação ao preço máximo de R$ 4,188, estabelecido pelo edital. O edital prevê cinco praças de pedágio neste trecho.

O trecho da BR-393, da divisa de Minas Gerais e Rio de Janeiro até a via Dutra terá R$ 2,94 por pedágio, o que representa um deságio de 27,17%.



Notas:
1. Cloraldino Severo tem 45 anos de experiência em planejamento de transportes no Brasil. Foi diretor do DNER, presidente da extinta Empresa Brasileira de Planejamento de Transportes e Ministro dos Transportes no período de 1982-85.
2. Para mais informações ver Carta Capital, nr 465 de 10/10/07.

O "jurômetro"

CLÓVIS ROSSI (Folha de São Paulo, 07/10/2007)

SÃO PAULO - Nada contra o "impostômetro" montado pela Associação Comercial para mostrar o quanto o brasileiro paga de impostos. Mas o placar só ficaria completo se alguém se dispusesse a montar o "jurômetro", o quanto o governo paga de juros aos detentores da dívida pública.
Houvesse tal contagem, o brasileiro ficaria sabendo que é o pagamento de juros o maior responsável pelos números altíssimos do "impostômetro".
No primeiro mandato do presidente Lula, conforme compilação de João Sicsú, economista hoje no Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), para a revista "Rumos do Desenvolvimento", os juros comeram R$ 587,9 bilhões. Correspondem a 25% de tudo o que país produziu em 2006, à imponente média de algo em torno de 6% ao ano.
Para comparação, sempre segundo a mesma fonte: com educação, os gastos somaram R$ 62,3 bilhões; com saúde, R$ 136,3 bilhões.
Como lembra freqüentemente Marcio Pochmann, ex-Unicamp, ex-secretário de Marta Suplicy e hoje presidente do Ipea, 80% do que é pago de juros vai para o bolso de apenas 20 mil famílias, a elite da elite, essa que o petismo ama atacar, mas alimenta caprichosamente ano após ano (como o fazia o governo anterior, aliás).
Como diria o próprio Lula, nunca neste planeta se transferiu tanto dinheiro do conjunto dos contribuintes para os ricos mais ricos.
Não há a mais leve perspectiva de que essa transferência maciça seja reduzida nos próximos anos. Logo, fica sendo mais uma bravata sem sentido a tese (de resto correta) de Lula segundo a qual o governo deveria "contratar mais gente, mais qualificada, mais bem-remunerada, porque aí teremos também serviços de excelência prestados para a sociedade brasileira".
É tudo o que não existe nem vai existir no futuro próximo.