terça-feira, 23 de abril de 2013

A república do Atraso


Carta Capital - 17 de abril de 2013.
Matéria completa: A república do atraso
Certa vez, o economista Amir Khair, professor da FGV e ex-secretário de Finanças de São Paulo, viu-se diante do desafio de conciliar os interesses de empresários nacionais e estrangeiros no projeto de uma joint venture. Os investidores japoneses se queixavam do estilo dos sócios brasileiros. Eles eram rápidos no planejamento, mas lentos para tocar uma obra. Os nipônicos preferiam o oposto: gastar mais tempo no projeto e executá-lo em curto prazo. "Hoje, ao analisar as grandes obras públicas no Brasil, sou obri- gado a concordar com os japoneses. O que mais atrasa e gera desperdício são os proje- tos malfeitos, e não a corrupção."

Exemplos de empreendimentos abandonados, interrompidos ou suspensos ilustram bem a conclusão do economista. Em julho de 2012, foram concluídos os parques eólicos da região de Caetité, na Bahia. Não há, porém, linhas de transmissão para levar a energia às usinas. Um erro de cálculo que compromete o crescimento e a competitividade do País.

Carta Capital avalia, a seguir, a situação de cinco grandes projetos inconclusos há décadas. Os problemas são variados: interrupções no repasse de verbas, licitações suspeitas, indícios de superfaturamento, longas batalhas judiciais. Em comum, graves falhas de planejamento, da elaboração dos projetos à fiscalização.

Segundo o Tribunal de Contas da União (TCU), entre 2008 e 2012, o Brasil poderia evitar a perda de 10 bilhões de reais se corrigisse as irregularidades encontradas em obras públicas. "Os problemas mais recorrentes estão nos projetos e no orçamento. Das 200 obras fiscalizadas em 2012 havia deficiências de projeto em 49%. Sobrepreços ou superfaturamentos ocorreram em 46%", afirma Augusto Nardes, presidente do TCU. "Falhas nos projetos podem levar a aumentos substanciais no valor do empreendimento, que pode ficar sem recursos para sua conclusão."

O desperdício de dinheiro público é apenas uma fração do que o País perde com obras mal executadas, algo de difícil mensuração em estudos. Apenas com a falta de investimentos em Logística, o Brasil desperdiça 168 bilhões de reais por ano em competitividade na comparação com os EUA, segundo um estudo recente do professor Paulo Resende, da Fundação Dom Cabral.

Só há um caminho para destravar os investimentos, dizem analistas. O Brasil precisa planejar melhor. Após décadas de aportes públicos diluídos, o País vive uma retomada de esforços federais com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que, no entanto, sofre para cumprir o cronograma. De 2007 a 2010, o governo executou 302,5 bilhões de reais em obras, 46,1% do previsto.

O desembolso do PAG 2 é melhor, mas ainda assim abaixo do esperado. Do 1 trilhão previsto entre 2011 e 2014 foram gastos nos dois primeiros anos 472,4 bilhões, ou 47,8%. "O Brasil faz hoje, ao mesmo tempo, pontes em Manaus e reformas em 20 aeroportos. E um canteiro de obras gigante que exige do governo um planejamento nunca feito antes", diz Trajano Quinhões, presidente da Anesp, associação nacional dos profissionais de gestão pública.

Adaptar-se a esse novo cenário inclui realizar licitações com planos mais detalhados, para evitar reajustes imprevistos na fase de construção, comuns em obras feitas com projetos básicos. "A lei permite aditivos de até 25% do valor da obra. Ao superar isso, outra licitação deve ser feita. Isso dá margem à corrupção", diz Eduardo Padilha, especialista em infra-estrutura e professor do Insper.

A opinião é compartilhada por Khair. "Não faz sentido uma licitação apenas com o projeto básico, como a lei autoriza", avalia. Outro grave problema, diz, é a falta de um corpo técnico qualificado no setor público. "Os governos deveriam atrair os melhores profissionais para planejar as grandes obras, mas continuam a pagar salários bem inferiores aos da iniciativa privada."

Parte das obras não sai como o planejado por outro motivo. Os órgãos públicos responsáveis não acompanham adequadamente sua execução. "O PAG tem 1 trilhão para gastar, mas a máquina pública foi reforçada?", pergunta Quinhões. "Quando o TGU se manifesta é porque todas as etapas anteriores de controle falharam."

segunda-feira, 22 de abril de 2013

Inflação terá forte queda entre maio e agosto, mostra estudo


Por Cristiano Romero do Valor Econômico
A inflação, medida pelo IPCA, deve continuar alta neste mês, mas cairá fortemente entre maio e agosto. É alta a probabilidade de o índice, em algum desses meses, registrar deflação. A previsão é do economista-chefe do banco Credit Suisse, Nilson Teixeira, um dos analistas que acertam projeções econômicas no país.
Num estudo oferecido com exclusividade ao Valor, Teixeira e sua equipe estimam que o IPCA de abril, ainda pressionado pelos alimentos, atingirá 0,45%, face a 0,47% de março. Por razões sazonais, nos próximos quatro meses o índice terá forte queda, auxiliada por uma série de desonerações tributárias e outras medidas adotadas pelo governo federal.
Os preços dos alimentos in natura, que incluem os grupos tubérculos (batata, por exemplo), raízes, legumes, hortaliças, verduras e frutas, costumam aumentar entre janeiro e abril, recuar entre maio e setembro e subir novamente entre outubro e dezembro. Nos últimos 12 meses, esse padrão foi alterado pela expressiva alta dos preços ao longo de todo o período. "Em março, os preços desses alimentos estavam 39% superiores ao nível do mesmo mês do ano anterior, sendo que nossa projeção é de que a inflação acumulada em 12 meses em abril seja de 48%", diz Teixeira.
A inflação de bens industriais, serviços e preços administrados (ex-alimentos) também tende a diminuir entre abril e agosto. Uma explicação para isso é que, nesse período, geralmente não há reajustes de preços monitorados e de serviços. Os aumentos são mais comuns no começo do ano - por exemplo, transporte urbano, mensalidade escolar e serviços por causa da correção do salário mínimo.
Um conjunto de seis fatores deve contribuir para o forte recuo do IPCA projetado pela equipe do Credit Suisse. O primeiro é a já mencionada redução dos preços dos alimentos in natura - se voltarem a patamares históricos, contribuirão com recuo de 0,45 ponto percentual da inflação no curto prazo. Já a desoneração de impostos do transporte urbano (PIS-Cofins sobre óleo diesel) pode evitar alta de 0,15 ponto percentual do IPCA neste ano.
A limitação do reajuste das distribuidoras de energia em 2,99% ao longo do ano pode impedir alta de 0,11 ponto percentual do IPCA em 2013. Nesse caso, o Tesouro teria que compensar a diferença financeira entre o reajuste autorizado pela Aneel e esse limite de 2,99%. O Credit Suisse projeta reajuste médio, no ano, de 7% nas tarifas cobradas pelas distribuidoras.
Em estudo pelo governo, a desoneração de equipamentos hospitalares, por sua vez, reduziria os reajustes dos planos de saúde e evitaria alta de até 0,21 ponto percentual na inflação deste ano. Já decidida, a manutenção da desoneração do IPI de automóveis impedirá, por sua vez, elevação de 0,15 ponto percentual na inflação. A desoneração de PIS-Cofins sobre etanol tenderia a reduzir o IPCA em 0,12 ponto percentual.
No total, as iniciativas de desoneração mencionadas poderiam evitar alta de 0,74 ponto percentual no IPCA em 2013, o que explica a obsessão do governo em enfrentar a inflação por meio da adoção dessas medidas, em vez de recorrer apenas à política monetária clássica (elevação dos juros).
Sem considerar essas desonerações, Teixeira e sua equipe fizeram simulações para três cenários distintos quanto ao comportamento dos preços de ex-alimentos e de alimentos in natura nos próximos meses. Para os demais alimentos (no domicílio e aqueles que não são in natura), determinaram impacto negativo de 0,25 ponto percentual no IPCA entre abril e maio, decorrente da desoneração da cesta básica realizada pelo governo.
Com base nessas premissas, no cenário pessimista, em que a inflação de ex-alimentos segue a trajetória máxima observada entre 2005 e 2012 e ocorre uma reversão de 50% nos preços dos alimentos in natura, o IPCA dos meses de maio a agosto e o acumulado em 12 meses seriam, respectivamente, de 0,39% (6,5%), 0,22% (6,7%), 0,31% (6,5%) e 0,35% (6,5%). No cenário médio, em que a inflação de ex-alimentos segue a trajetória média do período entre 2005 e 2012 e materializa-se reversão dos alimentos in natura para patamar próximo ao de dezembro de 2012, os resultados seriam: 0,24% (6,3%), - 0,07% (6,2%), 0,03% (5,8%) e 0,19% (5,5%).
No cenário otimista, em que os ex-alimentos seguem a trajetória mensal mínima verificada entre 2005 e 2012 e reversão de 1,5 vez da diminuição dos preços dos alimentos in natura considerada no cenário neutro, haveria deflação em três meses e inflação zero em agosto - - 0,01% (6,1%), - 0,38% (5,6%), - 0,35% (4,8%) e 0,0% (4,3%). "Mesmo no cenário mais pessimista, em que a inflação de ex-alimentos registre o seu patamar máximo entre 2005 e 2012 nos meses de maio, junho, julho e agosto e a reversão de preços dos alimentos in natura seja apenas parcial, a inflação permanecerá muito inferior à dos últimos meses", acredita Nilson Teixeira.

sexta-feira, 12 de abril de 2013

Se aumentar a Selic, o BC perderá o bonde



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Implantado no início dos anos 2000 , o sistema de metas inflacionárias – adotado pelo Banco Central – fez parte do aparato institucional global destinado a colocar a política econômica sob controle estrito do mercado.
O modelo funciona assim:
  1. BC e mercado trabalham em torno de um mesmo modelo econômico de previsão da inflação.
  2. Nesse modelo, o fator expectativa é dominante. Define-se uma meta de inflação. Se o mercado acha que a inflação futura pode subir, a resposta do BC é aumentar a taxa básica de juros da economia. Com isso, interfere em todo o sistema de taxas, derrubando a demanda agregada e o emprego, até que as expectativas convirjam para a meta.
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O sistema despertou críticas em muitos países, por subordinar a política monetária exclusivamente às metas de inflação, deixando de lado outras preocupações, com emprego, crescimento etc. E deixando de lado ferramentas clássicas de controle da demanda, como compulsório (percentual dos depósitos bancários em poder do BC) e atuações diretas sobre o crédito.
No caso brasileiro, as distorções foram muito piores. Tem-se um mercado de opiniões cartelizado – dominado por poucas consultorias e departamentos econômicos atuando em dobradinha com a imprensa financeira – que passaram a deter um controle absurdo sobre as expectativas..
Durante anos de juros, a inflação poderia aumentar, não pelo efeito inócuo da Selic, mas devido ao terrorismo exarado por essa aliança. Criou-se uma resistência enorme a qualquer queda de juros.
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A partir de 2011, o BC e o Ministério da Fazenda resolveram encarar o desafio de desarmar a armadilha dos juros altos.
Esse desafio deu-se em algumas frentes. A primeira foi o fim do mito da elevação automática da Selic a qualquer soluço da inflação. Em agosto de 2011, contra a opinião maciça do mercado o BC reduziu a Selic. Mesmo assim, a inflação caiu nos meses seguintes.
A segunda foi o uso dos bancos públicos para derrubar os spreads bancários e instituir a competição.
Até agora, o jogo foi vitorioso. As taxas cederam, criou-se uma competição efetiva no mercado de crédito ao consumidor e, a queda nas taxas chegou até o mercado de longo prazo dos financiamentos habitacionais, graças ao recurso da portabilidade – a possibilidade do cliente trocar de banco levando seu financiamento.
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Ao lado de Sérgio Werlang, o atual presidente do BC Alexandre Tombini foi um dos pais da implantação do sistema de “metas inflacionarias” – um trabalho de fôlego na época, antes de se entender as contraindicações.
Talvez tenha sido esse sentimento que enfrentasse o mercado em 2011, mas sem ter tido a coragem de desarmar a armadilha das metas inflacionárias.
Teve uma vitória retumbante mas não desarmou a armadilha das metas inflacionárias.
Agora tem-se a inflação sendo pressionado por um conjunto de fatores com pouca relação com excesso de demanda. Mas o terrorismo do mercado, as seguidas insinuações sobre a suposta falta de independência do BC e falta de vontade de enfrentar as pressões inflacionarias aparentemente balançaram Tombini.
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Se elevar a Selic o BC terá piscado. Haverá uma sinalização geral para o sistema bancário deixar de lado a disputa pela baixa dos juros e spread.
Nem em dois mandatos o governo Dilma conseguirá repetir a articulação que garantiu queda de juros e spread.