quarta-feira, 8 de abril de 2009

Brasil resiste à onda negativa. Isso é bom?

Luiz Sérgio Guimarães
Valor Econômico 08/04/2009

Em dias de otimismo em Nova York, os mercados brasileiros costumam operar mais animados do que a onda externa autorizaria. A recíproca não é verdadeira. Muitas vezes, os pregões domésticos não aceitam integralmente a orientação vinda de fora se ela é exageradamente negativa. Foi o que aconteceu ontem. A Bovespa resistiu à maior parte da influência deletéria procedente do Dow Jones e, enquanto este tombou 2,34%, o índice paulista recuou 0,78%. O dólar fechou no viés de baixa que indica distensão. Cotado a R$ 2,2170, desvalorizou-se 0,04%. E o juro persistiu em queda no mercado futuro. A taxa do swap de 360 dias cedeu de 9,88% para 9,84%. Essa alienação parcial dos mercados locais é boa ou ruim? Ela pode estar baseada em uma expectativa completamente falsa.

Há um cenário considerado pelas instituições tão verdadeiro, por si mesmo incontestável, que dispensa a apresentação de provas. Trata-se do vaticínio de que o Brasil será o emergente menos afetado pela crise e o primeiro a sair dela. Isso está sendo repetido com a mesma insistência que a qual foi reiterada, no meio do ano passado, a tese do "decoupling", o desacoplamento dos emergentes da crise irradiada pelos EUA. O deslocamento, logo se viu, não resistiu às primeiras informações sobre a atividade no quatro trimestre de 2008. O Brasil entrou tecnicamente em recessão com a inevitável queda do PIB no primeiro trimestre de 2009. Com abril, se inicia o segundo trimestre. Já voltamos a crescer?

A suposição de que o Brasil é melhor que os outros e sairá primeiro e quase incólume do atoleiro dispensa o Banco Central de medidas anticrise mais enérgicas. Trata-se da reiteração do erro básico, o de sempre propugnar por uma política monetária mais conservadora do que o necessário; a reprise do erro que, só para ficar em exemplos recentes, levou o Copom a manter a Selic em elevadíssimos 11,25% entre setembro de 2007 e março de 2008; a desfechar um ciclo de aperto para supostamente debelar um choque de oferta e puxar a Selic para até 13,75% quando já estava em curso nos EUA uma megacrise de crédito; e a retardar o ciclo de baixa em dezembro quando já estava evidente a devastação ocorrida na economia mundial. E agora viceja a tese do milagre da recuperação brasileira antes dos demais países. Tal tese, incompatível com os dados recentes sobre atividade e inflação, só interessa a quem quer evitar os prejuízos que viriam com o aprofundamento do corte da Selic.



Pelos dados divulgados ontem pela CNI, o Nível de Utilização da Capacidade Instalada (NUCI) da indústria - um dos mais observados pelo Copom - bateu em 77,8% em fevereiro, estável na comparação com janeiro. O que significa a estabilidade? Significa manutenção de elevada ociosidade na indústria, o que explica as deflação do IPA e do IGP-DI. Este caiu 0,84% em março, após baixa de 0,13% em fevereiro. Se o Copom quiser reiterar a sua ortodoxia monetária no dia 29 terá de cortar a Selic em mais 1,5 ponto, para 9,75%. Se o Copom quisesse fazer cumprir as profecias sobre o novo milagre brasileiro teria de dar um choque nas expectativas por meio tanto de um corte da taxa básica direto para 9% quanto de uma redução mais acentuada dos compulsórios e introdução de novos estímulos administrativos ao crédito. As medidas contracíclicas fiscais já se esgotaram, só restam as políticas de juro e de crédito.

O Brasil não pode mesmo ficar dependente do humor externo, mas por razões objetivas, não por meras expectativas. Nesta segunda semana de abril, o mercado externo inverteu completamente a direção de franca euforia exibida na primeira. Tudo indica que os especuladores usaram fatos como a reunião do G-20 para puxar preços de ativos de forma a vendê-los depois em condições mais favoráveis. É o que está acontecendo agora, no início da safra de balanços trimestrais de corporações americanas. Antes da Alcoa divulgar, depois de encerrado o pregão da Nyse, um prejuízo de US$ 497 milhões, a bolsa foi abalada pelas informações de que a GM prepara aceleradamente a sua concordata. O papel da montadora fechou com perda de 11,89%. O mercado já amanheceu azedo, sob influência da notícia de que o FMI estaria dobrando a magnitude do lixo tóxico para US$ 4 trilhões e da revisão do PIB da zona do euro para uma contração de 1,5% no quatro trimestre de 2008. Pela informação anterior, a retração era menor, de 1,3%.

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