Por Ronaldo Bicalho
No primeiro dia do mês de Agosto deste ano entrou em vigor a nova lei de incentivo às fontes de energia renováveis na Alemanha. A chamada EEG 2.0 (Erneuerbare Energien Gesetz – Lei das Fontes de Energia Renováveis) representa um forte ajuste na política energética alemã de apoio a essas fontes.
O freio de arrumação na transição energética alemã (energiewende) é fruto das fortes pressões a favor da reformulação do programa advindas principalmente dos setores industrial e elétrico alemão, assim como da própria Comunidade Europeia.
Com um custo estimado de um trilhão de Euros até 2030, uma das grandes ameaças à energiewende passou a ser a explosão das tarifas de energia elétrica puxada, principalmente, pela forte expansão da energia solar; fortemente subsidiada pelo esquema de tarifação Feed-in, que garante a rentabilidade dos investimentos em renováveis durante 20 anos.
Com uma conta de 20,4 bilhões de Euros chegando aos bolsos dos consumidores em 2013 – com expectativa de aumentar para 23,6 bilhões em 2014 -, as mudanças no esquema de subvenções às energias renováveis tornaram centrais para a sustentabilidade política e social do programa.
Mesmo não tendo que pagar 100% das taxas de incentivos às renováveis, em função de um mecanismo de proteção às indústrias intensivas em energia, os grandes consumidores alemães têm de pagar uma tarifa de €100 por MWh, ao passo que nos Estados Unidos o consumidor industrial paga em média menos de €55 por MWh. No caso do consumidor industrial alemão médio, sem o mecanismo de proteção, esse valor atinge €145 por MWh. O gráfico abaixo apresenta as tarifas industriais alemãs em relação em relação a outros países e sintetiza as dificuldades para a manutenção da competitividade industrial do país face ao movimento de aumento da tarifa de eletricidade; em contraste, fundamentalmente, com a manutenção das baixas tarifas americanas.
Considerando que o próprio mecanismo de proteção aos grandes consumidores estava em xeque e fatalmente seria significativamente reduzido, as pressões para a redução das subvenções as renováveis em nome da manutenção da competitividade da indústria alemã se tornaram fortíssimas.
Do lado do setor elétrico, a expansão acelerada da participação das renováveis na matriz elétrica gerou problemas imprevistos. O mais importante foi a inviabilização econômica da operação das modernas plantas de gás natural que haviam entrado a partir de 2009. Com a preferência das renováveis no despacho, essas plantas passaram a operar durante um tempo muito menor do que aquele que havia sido projetado para garantir a sua economicidade.
A questão aqui é que o problema não é simplesmente econômico, a retirada dessas plantas do sistema, em função da sua não economicidade, acaba gerando sérios problemas de confiabilidade e segurança do suprimento. De tal forma que a questão de quem faz o back-up das renováveis foi para o centro das preocupações.
Lembrando que as quatro grandes empresas que detém o controle do setor elétrico alemão são responsáveis apenas por 6% da capacidade instalada de geração renovável, estabeleceu-se um impasse entre o programa de renováveis e a sustentabilidade do setor elétrico tradicional alemão. Esse setor ainda joga um papel relevante em termos da manutenção das grande infraestruturas de transmissão e distribuição, assim como na manutenção da segurança do suprimento via manutenção de margens de reserva/segurança. Sem contar os grandes investimentos necessários à expansão e modernização das redes – em torno de 2 bilhões de Euros por ano.
Para fechar o arco de pressões, a Comunidade Europeia considerou que o pacote de incentivos às renováveis, principalmente o esquema de proteção aos grandes consumidores, caracterizava uma intervenção indevida do Estado alemão a favor dessas empresas, prejudicando a livre competição no mercado europeu.
Em função desse quadro, menos de um ano depois das eleições gerais de Setembro de 2013, entrou em vigor a nova EEG 2.0, fruto da coalizão entre os democratas cristãos do CDU, da primeira-ministra Angela Merkel, os socialista do SPD e os socialistas cristãos do CSU.
A política energética nascida dessa coalizão e que sustenta as mudanças na lei das fontes de energia renováveis se baseia em três pilares:
- Compatibilidade ambiental e climática
- Segurança de suprimento
- Acessibilidade em termos de preço. Ou seja, a expansão futura da infraestrutura de energia deve ser implementada levando-se em conta a eficiência de custos.
Essa mudança na política energética implicou em uma reforma substancial da EEG cujos traços marcantes são os seguintes:
- Redução do apoio às novas plantas e manutenção dos incentivos às já existentes.
- Todas as tecnologias deverão ter os incentivos reduzidos ao longo do tempo.
- Os bônus garantidos como apoio às renováveis serão revisados e a maioria deles será simplesmente abolida.
- O privilégio verde dado à eletricidade gerada na Alemanha a partir de fontes renováveis, em prejuízo à eletricidade gerada fora do país, será abolido.
- Alinhamento às leis europeias.
O que cabe ressaltar a partir dessa análise preliminar dessas mudanças na política energética alemã é a tentativa de recuperar um aspecto chave da transição do sistema energético alemão em direção às fontes de energia limpas.
Aqui, não se trata apenas de reduzir as emissões de CO2 para fazer face ao aquecimento global, trata-se de fazer isso sem sacrificar a competitividade da indústria alemã. Não basta ampliar a participação das renováveis na matriz energética, é preciso que isso seja feito em condições de disponibilidade e custo da energia que permita a manutenção das atividades econômicas nos padrões competitivos atuais; mesmo no caso das indústrias intensivas em energia. (...) O texto continua no Blog Infopetro.
Nenhum comentário:
Postar um comentário