
Aliança pelo Brasil
Empresariado liderado por Skaf desperta do sono a luta de classes
por J. Carlos de Assis
A operação mais bem sucedida do capitalismo no século XX foi mascarar a exploração da força de trabalho mediante a aceitação progressiva dos chamados direitos sociais. Embora os comunistas ortodoxos nunca tenham aceito isso, o ímpeto revolucionário da classe trabalhadora esmaeceu-se diante de políticas concretas de bem-estar social. Esse processo correspondeu a conquistas políticas que pareciam definitivas, concretizadas em orçamentos públicos que, em teoria, faziam parte da mais valia social que retornava aos trabalhadores.
A reversão desse processo se deveu à revivescência do velho liberalismo, sob o nome de neoliberalismo, a partir das políticas de Ronald Reagan e Margareth Thatcher no início dos anos 80. O papel desses dois políticos foi fazer cair a máscara da exploração da força de trabalho pelo grande capital. O expediente para isso consistiu em atacar o gasto público social através do qual parte da mais valia subtraída ao trabalhador volta para ele sob a forma de benefícios sociais como saúde, educação, previdência e assistência social.
A teoria política da necessidade degradação dos serviços sociais foi desenvolvida inicialmente por Hayek sob o argumento de que tais direitos expressavam um aspecto do Estado totalitário. No princípio, não era levado a sério. Depois recebeu contribuição de Milton Friedman, e assim mesmo não pegou. A situação mudou com o fim da União Soviética: embora o regime comunista não fosse nada simpático à maioria das sociedades, a simples ameaça dele na Guerra Fria moderava o apetite de exploração de classe do lado de cá.
Agora voltamos ao começo do século XX, quando a exploração de classe era descarada e o sistema político era indiferente às necessidades sociais. Basta lembrar, a esse respeito, que em fins do século XIX o orçamento da Inglaterra, o país mais rico do mundo, não passava de 8% do PIB, a maior parte gasta em polícia e forças armadas. Nesses últimos anos após 2008, a crise na Europa se traduz em contração orçamentária para liquidação de direitos sociais, sobretudo na área do euro, com o objetivo de pagar pela especulação financeira desenfreada.
Esse preâmbulo não tem a ver exclusivamente com história, ou com os europeus. Os trabalhadores dos países desenvolvidos, que estão sendo saqueados, cedo ou tarde saberão reagir. Tenho em vista, ao contrário, a questão nacional. Pois grande parte do empresariado brasileiro, chefiado por essa figura patética de Paulo Skaf, decidiu reinaugurar, depois de um século, a luta de classes no Brasil. E o eixo dessa conspiração regressiva é a tentativa de impeachment contra Dilma Roussef, colocando ricos contra pobres numa escala inimaginável.
Querem uma tradução dessa luta política em termos marxistas? Vai lá, talvez isso ajude a levantar o ânimo do movimento trabalhista em torno de questões cruciais para seu bem estar. A mais valia é trabalho não pago à força de trabalho; o valor da força de trabalho é o valor da sua reprodução, governado por condições sociais e a lei de oferta e procura; o valor da mercadoria é o valor-trabalho nela incorporado. A mais valia, assim, é a margem entre o valor da mercadoria a ser realizado e o valor da força de trabalho.
Então, doutor Skaf, o que você pretende é impedir que parte da mais valia social – a diferença entre trabalho pago e trabalho não pago – volte, através do orçamento público, como benefícios a seu único gerador, o trabalhador. Sua luta contra impostos e pelo impeachment são duas faces de uma mesma moeda, na medida em que, no fundo, seu objetivo é destruir direitos sociais (e a possibilidade de ampliá-los) e afastar um projeto de Governo que, com todas as limitações, fez uma efetiva opção pelos pobres.
Estou usando propositadamente uma linguagem marxista para lembrar ao empresariado, em especial o empresariado golpista, que o sonho do socialismo não morreu com a União Soviética, nem mesmo a União Soviética foi o sonho de todos os socialistas. Cuidado, portanto. Estão despertando a ira das massas. Há um elemento quantitativo em jogo: os capitalistas se concentram e são muito poucos; a classe trabalhadora são muitos. Pessoalmente gostaria de viver numa sociedade de bem-estar social, com um capitalismo domesticado a la Keynes. Skaf e os seus querem a liberdade sem limites do capital. Ganharão?
J. Carlos de Assis - Economista, professor, doutor pela Coppe/UFRJ
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