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SAB, 22/11/2014 - 13:37
ATUALIZADO EM 22/11/2014 - 13:38
Folhapress
16/04/2012
16/04/2012
Reformas podem assegurar crescimento da economia no longo prazo, diz Levy, hoje
no mercado financeiro
Joaquim Levy, diretor da Bram, gestora de investimentos do Bradesco
ÉRICA FRAGA; MARIANA SCHREIBER; DE SÃO PAULO
Um dos principais formuladores da política econômica do primeiro governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva diz que o país deveria desistir de tentar crescer no ritmo acelerado de outros emergentes, como China e Índia, e ganharia mais se trabalhasse para tornar sustentável o crescimento do país.
"Não dá para querer crescimento de Índia e China, pois a Índia é quase o Brasil dos anos 1970", diz o economista Joaquim Levy, que chefiou a Secretaria do Tesouro Nacional no início do governo Lula. Hoje, dirige a Bram, do Bradesco, especializada em gestão de investimentos.
A economia brasileira cresceu apenas 2,7% em 2011 e a taxa de expansão do PIB (Produto Interno Bruto) deve se aproximar de 3% neste ano, segundo projeções do mercado. O governo quer crescer ao menos 4,5% e tem adotado medidas de estímulo à indústria e outros setores.
Em entrevista à Folha, Levy diz que é natural que os governos tenham papel mais ativo em momentos turbulentos, mas acha que está na hora de o governo brasileiro "deixar a economia respirar".
Leia a seguir os principais tópicos da entrevista, concedida por e-mail:
Controle de capitais
É natural que em momentos de crise o governo tenha um papel maior, afinal ele é uma instituição que existe exatamente para enfrentar desafios que superam a capacidade individual dos cidadãos. É que nem organizar a produção em período de guerra. E, quando acaba a guerra, os recrutas voltam à vida normal. Com a economia provavelmente também será assim, sem que a gente precise dos exageros dos anos 2000.
Há bastante tempo antes da crise, se apontava um relaxamento regulatório, por exemplo, nos Estados Unidos, que estimulou a tomada de risco pelo setor privado, talvez para manter a economia girando enquanto o governo evitava enfrentar desafios fiscais e estruturais.
Isso vai exigir um ajuste longo, mas não foi ou é [problema] único dos EUA ou do capitalismo em si, mas de política em geral.
Crescimento e inflação
Não acredito que haja expectativa de que mais inflação vai gerar crescimento ou emprego, e isso é enfatizado em todas as atas do Copom [Comitê de Política Monetária do Banco Central].
Por outro lado, na situação peculiar que o mundo vive, há choques nos preços de commodities e um excesso de liquidez global que dificulta manter a inflação baixa em um país que está crescendo.
O que eu acho mais relevante na política monetária nesses dois últimos anos foi o amadurecimento da discussão. O BC conseguiu tornar consenso que o mix fiscal-monetário [controle da inflação por meio da taxa de juros e da contenção dos gastos públicos] é essencial -algo que se sabe há tempos e o Tesouro Nacional sempre sublinhou, mas que por razões diversas não estava tão explícito.
A discussão mais recente da produtividade, não só na indústria, é outro passo importante. Esses progressos têm facilitado para o BC flexibilizar os juros sem risco exagerado para o sistema de metas de inflação.
Aliás, a mensagem dos relatórios de inflação tem sido de que as metas de inflação são para valer e taxa de juros, um modo legítimo de implementar a política monetária, só que agora coordenado com a política fiscal. Não tenho dúvida que o BC subirá os juros se precisar. Eles são a ferramenta de excelência para o controle da inflação.
Metas de inflação
O regime de metas continua atualíssimo. Veja que o próprio Fed [BC americano] resolveu explicitar não só as projeções de juros, mas principalmente como procura cumprir seu mandato.
O [presidente do Fed] Ben Bernanke falou que precisava de uma meta de inflação porque ajuda a diminuir o desemprego, para o qual não dá para estabelecer uma meta, porque é difícil descobrir a "taxa natural". A discussão assim fica mais compreensível e, portanto, democrática.
Gastos públicos e crescimento
O crescimento sempre ajuda, e a disciplina continua indispensável. Priorizar é escolher entre coisas que têm mérito, e por isso é difícil.
Em relação ao crescimento, se a gente comparar o desafio fiscal em 2000 e agora, o que se vê é que naquela época havia uma enorme demanda social, reprimida pela desordem dos anos 1980 e 90, que punha pressão no gasto corrente. Foi nesse contexto, por exemplo, que foi passada a emenda do gasto mínimo com a saúde, que continua importante.
Mas, nos anos recentes, fica evidente, por exemplo, que a sociedade, incluindo a classe C, ficou mais confortável em poupar para ter um plano de saúde privado. Na verdade, isso se tornou aspiracional e um complemento para qualquer emprego. Então, hoje o governo tem fôlego para direcionar mais recursos para o investimento, sem aumentar a carga tributária.
Cortes em 2011
Claro que, como o presidente Lula dizia, dinheiro é talvez um dos ingredientes menos importantes para esse investimento, pois há um deficit de capacidade de projeto, implementação etc., decorrente de três décadas de baixo investimento no setor público.
A diminuição do investimento em 2011 se explica em parte por isso. Esse deficit vem sendo atacado. O próprio PAC [Programa de Aceleração do Crescimento] e a reformulação do Dnit [Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes] e da Funasa [Fundação Nacional de Saúde] vão nessa direção. Além disso, a presidente [Dilma Rousseff] mostrou que não há conflito entre investimento público e trazer capital e tecnologia privada, por exemplo, via concessões.
Quanto crescer
A nossa renda per capita, assim como nossa produtividade, ainda é menor que nos Estados Unidos ou no Japão. Mas estamos crescendo, e o importante é o crescimento ser sustentável.
Não quero ser complacente, mas a nossa demografia se estabilizou e somos um país de renda média, ainda que mal distribuída. Então não dá para querer crescimento de Índia e China, pois a Índia é quase o Brasil dos anos 1970.
E, falando nisso, felizmente temos menos problemas que a Bélgica, a começar pela nossa dívida pública... O Brasil "macunaimizou" a dicotomia Belíndia [misto de Bélgica e Índia, na expressão de Edmar Bacha].
O desafio mesmo é a fronteira tecnológica e do conhecimento. É a nossa agência espacial virar uma fonte de inspiração e desenvolvimento como a Nasa, e a pesquisa promovida por empresas crescer, objetivo para o qual o pré-sal deve ajudar.
Daí a importância de um quadro regulatório que deixe o setor privado respirar, sem demérito do apoio do governo à pesquisa, que permanece fundamental.
A geração Y está com vontade de aprender e fazer acontecer, e vai à luta. Outro dia descobri que a jovem "maîtresse d'hôtel" de onde às vezes almoço faz MBA em liderança. Então é deixar a economia respirar, que as oportunidades e o crescimento vão aparecer.
O que fazer
Coisas como ponderação fiscal, para mostrar que há espaço para o setor privado crescer, ou a valorização da competição, sinalizadas, por exemplo, com os leilões de concessões.
Pegando esse exemplo, o desempenho do nosso fundo de infraestrutura, que investe em companhias listadas desse setor, reflete bem a contribuição da iniciativa privada para o investimento e o crescimento do Brasil, tendo tido um rendimento superior ao da Bolsa, em geral, nos últimos 18 meses.
Evidentemente, reforçar isso requer mais do que medidas pontuais, e a subida do preço dessas ações reflete um grau de confiança em opções fundamentais do governo.
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