terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Copom planeja corte de 3 pontos na Selic

Luiz Sérgio Guimarães
02/02/2009 Valor Econômico

Os indicadores de atividade econômica precisam piorar muito e os de inflação mostrar preços completamente anestesiados ao longo de fevereiro e começo de março para o Banco Central alterar o seu planejamento para a política monetária e cortar a taxa Selic, na próxima reunião do Copom, dia 11 de março, mais fundo do que indicou a última ata. Após a leitura do documento, os analistas se convenceram que o Copom pretende fazer um corte total de três pontos. Quando a Selic chegar a 10,75%, ele para de reduzi-la. Por quê? A ata diz que com Selic a 10,75% no final de 2010, a inflação estará este ano e no próximo perto do centro da meta de 4,5%. Se o BC pretende estancar o ciclo de relaxamento quando a taxa chegar a esse patamar, a velocidade com que irá alcançá-lo é de menor importância desde que o mercado futuro de juros da BM&F se convença disso e incorpore essa expectativa aos contratos. O pregão ainda não fez isso face às reiteradas precauções do Copom.

Ao mudar radicalmente os termos da ata divulgada na quinta-feira - produzindo na prática um documento inteiramente novo -, o BC assumiu que errou na reunião de 13 de dezembro, quando manteve a Selic estável em 13,75%. Passar de um congelamento de taxa no absurdo patamar de 13,75% ao longo das últimas duas reuniões de 2008 para um ab-rupto corte de um ponto no encontro seguinte, ou é sinal de desmedida teimosia ou de falta de discernimento. Isso sem falar que o BC, supostamente mais bem-informado que o restante do mercado, em setembro, cinco dias antes de o Lehman Brothers quebrar e desencadear uma contração de crédito jamais vista, que empurraria o mundo no abismo da recessão, elevou a Selic de 13% para 13,75%. Apesar de todos os indícios em contrário, o BC temia, naquela época, que o dólar em alta contaminasse a inflação, a despeito do desabamento das commodities. Não aconteceu. Três reuniões depois, quando já é dispensável qualquer tipo de prova da ausência de "pass-through" cambial, a ata do Copom insiste em precaver-se contra futuros repasses. Rebuscadamente, tal excesso de cautela ortodoxa foi expressa na frase: "O efeito liquido da desaceleração global sobre a trajetória da inflação doméstica parece ser, até o momento, predominantemente benigno". Efeito líquido é a deflação que resulta da queda das commodities depois que se tira a alta do dólar. Atenção para a colocação de três expressões acautelatórias: "parece ser", "até o momento" e "predominantemente".

O mundo afunda em recessão e o BC não é capaz ao menos de indicar que persistirá cortando a Selic em um ponto. Tal indicação já seria suficiente para inclinar ainda mais negativamente a curva futura de juros, esta sim responsável pela definição do piso privado do custo do dinheiro. Se a ata apenas indica que a Selic continuará caindo (como se houvesse outra possibilidade, como se o BC acreditasse em magia econômica, na bruxaria do bem que de repente desenredasse o enrosco do crédito global e guindasse instantaneamente as economias do atoleiro), o BC está, na verdade, colocando um freio monetário à queda do juro futuro, portanto, ao custo do crédito. Há várias formas de se tornar conservadoramente uma política monetária mais rigorosa do que o necessário. A mais evidente é a alta do juro federal de curto prazo acima do que está sendo precificado a médio e longo prazo pelo DI. A outra é manter a taxa em patamar exageradamente alto por tempo excessivamente longo. A terceira - o caso atual - é imprimir uma velocidade de queda inferior à requerida para restaurar o livre funcionamento dos canais do crédito.

A baixa de 13,75% para 12,75% era o máximo que o BC poderia fazer? "Apesar de todas as críticas de que demorou a começar o processo de redução dos juros e de que estes ainda são muito altos, não se pode negar que o corte foi bastante agressivo para o histórico conservador do nosso BC", diz o economista-chefe do Banco ABC Brasil, Luis Otávio de Souza Leal.

A ficha do DI futuro, de que os fatos reais devem atropelar de novo as estratégias do Copom - de tal sorte que o erro de não ter iniciado o ciclo de afrouxamento em dezembro foi seguido pelo equívoco de ter feito um primeiro corte de apenas um ponto - começou a cair na sexta-feira. Num dia de mercados internacionais e domésticos muito ruins - portanto, de alta do dólar, cuja consequência temida pelo BC é o suposto repique inflacionário - o DI futuro intensificou o declínio. A taxa do swap de 360 dias recuou de 11,27% para 11,16%. O juro longo também mergulhou. O CDI previsto para janeiro de 2012 caiu de 11,85% para 11,79%. A certeza é de que os dados a respeito do lado produtivo da economia brasileira mostrarão, de novo, uma realidade mais perversa do que a imaginada pelo BC. Não que este seja otimista. Só não quer tomar decisões em sintonia com a gravidade do quadro por razões de obstinação ideológica.

Certamente, os modelos do BC já rodaram com a previsão de que a produção industrial deve ter desmoronado de novo em dezembro, após o tombo acumulado de 8% sofrido em outubro e novembro. O dado oficial será divulgado amanhã pelo IBGE e o mercado estima uma perda entre 6% e 8%. O BC já embutiu esse prognóstico em sua decisão de reduzir a Selic a 12,75% e ao indicar que não está seguro da premência e conveniência de fazer novo corte da mesma magnitude na reunião de 11 de março. Depende da grita?

Luiz Sérgio Guimarães é repórter de finanças

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