QUA, 14/10/2015 - 19:48
Por André Araújo
DUELO NAS NUVENS - O DEBATE ENTRE DESENVOLVIMENTISTAS E MONETARISTAS - No meio acadêmico brasileiro e com repercussão na política econômica trava-se um debate improdutivo entre seguidores de duas escolas de pensamento econômico. De um lado em minoria, mas com idealismo, os desenvolvimentistas, herdeiros de uma escola hoje desativada pela propria lógica da globalização, o credo de Celso Furtado e da CEPAL refletia uma visão de mundo do imediato pós guerra onde o crescimento dependia da industrialização e esta por sua vez necessitava, na visão da escola, de protecionismo e de apoio financeiro do Estado.
De outro lado os seguidores da escola que criou um modelo fechado e acabado, a Escola Monetarista ou Escola de Chicago, para ser mais preciso, a Segunda Escola Monetarista porque a primeira, de Irving Fisher, afundou com a crise de 1929 quando Fisher dizia, uma semana antes do "crash", que não havia nenhuma crise no horizonte.
A Escola de Chicago é basicamente a escola dos seguidores de Milton Friedman, ou melhor, daquilo que muitos imaginam que Milton Friedman pensava, os seguidores nem sempre são fiéis, Friedman por exemplo foi o pai intelectual do "bolsa família", por ele chamada de imposto de renda negativo e pelo ex-Senador Eduardo Suplicy de "programa de renda mínima", a ideia primeira no mundo foi de Friedman, que também era a favor das descriminalização das drogas.
A Escola de Chicago foi em larga medida concepção de Friedman, mas sua divulgação e expansão mundial deveu-se ao apoio material e institucional do então Citybank, que bancou por anos uma longa série de conferências e artigos de Friedman, história que desenvolvi longamente em um de meus livros. Friedman era um prolífico pensador mas o modelo por ele criado tornou-se independente e desenvolveu vida própria além do mestre. Seu herdeiro intlectual, Alan Meltzler, está hoje na Carnegie Mellon University mas seus discípulos mais conhecidos ficaram em Chicago.
O maior e pior produto da Universidade de Chicago foram os estudantes estrangeiros de seus cursos de mestrado e pós-graduação que no geral absorvem os ensinamentos como crentes de uma seita e voltam a seus países com o modelo pronto e acabado para ser aplicado em ambientes completamente contrastantes com o ar rarefeito da Região dos Lagos do centro dos Estados Unidos e da cultura civilizatória, cívica e ética que vem dos pais fundadores.
O mais interessante é que nos EUA a Escola de Chicago não é tratada como um modelo fechado pela simples razão que os Estados Unidos são o País do pragmatismo econômico, não segue escolas e muito menos ideologias.
O pragmatismo na condução da política econômica sempre foi a marca dos Estados Unidos como nação. Não seguem escolas e muito menos modelos, a política econômica é operada de acordo com as circunstâncias.
Exemplos não faltam. Na crise da Grande Depressão, a Presidência Roosevelt, que herdou um desemprego de 25%, resolveu enfrentá-lo com criação artificial de demanda através de extraordinária injeção monetária na economia.
Roosevelt usou um instrumento, a Reconstruction Finance Corp., criada pelo Presidente anterior, Herbert Hoover, com base numa ideia de Eugene Meyer, governador do Federal Reserve (até 1935 o Chairman tinha o título de Governor).
A RFC era o BNDES da época, financiou milhares de bancos e empresas quebrados para que se recuperassem, criou oito empresas estatais, uma das quais gerou o segundo ciclo da borracha na Amazônia, a Ruber Development Company (da qual meu pai foi executivo durante a guerra). Toda essa intervenção estatal era frontalmente contra os cânones ortodoxos, tanto que o New Deal foi fortemente combatido pelos conservadores e pela Suprema Corte.
Em 1973 a Presidência Nixon rompe com o padrão ouro, que era a base pela qual em Bretton Woods se aceitou o dólar como moeda reserva mundial. Foi a política das circunstâncias, os EUA não tem modelos, faz o que precisa fazer.
Em 7 de setembro de 1979 o Governo americano, assustado com a iminente qubra da montadora Chrysler, abre um aval de US$1.5 bilhão direto do Tesouro para a empresa, pelo prazo de 7 anos. Salvou a Chrysler, que repagou o crédito em 2 anos.
Na crise de 2008, logo em Setembro de 2008, o Tesouro americano abre um crédito de US$ 700 bilhões para salvar bancos em empresas em perigo de quebra. Não foi pouco dinheiro, US$ 245 bilhões para os bancos, 23 bilhões para financeiras darem crédito a compradores de máquinas, 80 bilhões para as montadoras de automóveis, 68 bilhões para a seguradora AIG, 46 bilhões para compradores de casas na iminência de retomada pelos bancos. Esse programa, com o acrônimo de TARP (Troubled Assets Relief Program) foi um sucesso, em dois anos quase tudo foi devolvido ainda com lucro de 11 bilhões ao Tesouro. O TARP salvou um milhão de empregos, foi um sucesso, um programa fora de todos os cânones do modelo da Escola de Chicago, que segue a linha "deixa qubrar", a mesma que o BC do Brasil segue hoje.
A melhor política econômica para o Brasil de hoje é a "política das circunstâncias". A dívida pública federal só em grande em 67% do PIB por causa da absurda taxa de juros. Com taxas baixas poderia ser expandida inclusive através do compulsório dos bancos. A política econômica necessita sim do combate às fraudes e desperdícios tanto em programas sociais, há muita fraude em todos como na aberração dos supersalários em todas as frentes. Quem paga tudo é o Tesouro, como é possível se admitir que corporações autônomas fixem seus próprios salários reais através da criação de "auxílios" e "adicionais", que fazem magistrados receberem 300 mil por mês, professores de universidades públicas ganharem 70 ou 100 mil por mês, aos milhares, também em todos os poderes legislativos do Pais, supersalários em Assembleias, a do Rio tem quase 400 supersalários, o Congresso custa tanto quanto o Congresso americano, em um país com o PIB oito vezes maior que o Brasil.
Ao lado do combate ao desperdício e à fraude, um vigoroso programa de obras de infraestrutura financiado por títulos públicos usados como pagamento, haverá quem aceite no mundo dos negócios, já foi usado no Brasil, na Alemanha e em muitos países. O único instrumento imediato para retomar o crescimento é o investimento público em infraestrutura, não há outro com efeito rápido, foi o mesmo usado por Roosevelt em 1933, por JK em 1955, pelo governo militar em 1965. Exportações levam muito tempo para crescer e seu efeito é limitado, consumo interno não decola porque as familias estão endividadas.
Quanto ao Banco Central, o pragmatismo americano deu exemplos concretos de como age o Governo frente à independência do Federal Reserve System. Em 1933, o Presidente Roosevelt viu que o Governador do Fed, Eugene Meyer, não iria colaborar com o New Deal. Mandou um aviso de que, apesar de ter ainda 4 anos de mandato, deveria sair para que o Presidente pudesse expandir o meio circulante para combater a depressão.
Quem enfrenta o poder do Presidente eleito dos EUA? Meyer saiu, era um homem importante, bilionário, dono do jornal The Washington Post, avô da Lally Weymouth, jornalista que entrevistou Lula e Dilma assim que eleitos. Meyer foi depois o primeiro presidente do Banco Mundial em 1946.
Em outro caso, na Presidência Truman, o Chairman do Fed, Thomas McCabe, o Rei do papel higiênico, dono da Scott Paper, entrou em confronto com o Secretário do Tesouro, John Snyder. Truman mandou um recado e McCabe pediu demissão, isso em 1951, tinha ainda 4 anos de mandato.
Quer dizer o Banco Central independente, vendido aqui como um mantra, não é realidade nos EUA, quando este entra em choque com o poder político quem sai de cena é o chefe do BC, é impossível a convivência de duas políticas antagônicas.
O modelo de metas de inflação é o alimentador da recessão brasileira, deve ser arquivado para que a economia seja relançada na rota do crescimento, quando começar a crescer, volte-se a atenção para a inflação. Um País geralmente não sai da recessão combatendo ao mesmo tempo a inflação, esse é um objeivo adversário do crescimento porque o crescimento necessita de injeção monetária e esta é contraditória com metas de inflação.
Os economistas de mercado, 95% dos economistas brasileiros da nova geração, vão torcer o nariz, eles não estão pedendo com a recessão, o sistema financeiro convive bem com a recessão porque aí se eleva o valor da liquidez que os bancos e os fundos dispõe para comprar ativos, barateados pela recessão.
Mas para o resto do País a recessão é mortal, destrói o tecido social, destrói as esperanças e o sistema de produção.
A registrar porque eu registro e parece que pouca gente repara: Não há uma única declaração do Ministro da Fazenda e do Presidente do Banco Central mostrando qualquer preocupação com o desemprego e a quebra de empresas.
Nos EUA, o Secretário do Tesouro e o Chairman do FED falam sobre desemprego em todas suas entrevistas. É uma preocupação central de suas poíiticas e de suas declarações. O emprego é a BASE da política econômica dos EUA.
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