domingo, 2 de agosto de 2015

Guerra Fria esquenta na TV

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Por Edgard Murano, do blog Achados & Escritos
Deutschland 83 (Sundance TV) ainda nem chegou ao final de sua primeira temporada e já é considerada pela crítica especializada uma das melhores séries do ano. A história se passa na Alemanha no auge da Guerra Fria: o jovem soldado Martin Rauch, que vive na porção socialista do país, é recrutado para se infiltrar como espião no lado ocidental, sob a promessa de que sua mãe conseguirá um lugar na fila de transplante de rim.
Cheio de reviravoltas, personagens interessantes e comentários políticos e sociais perspicazes, o seriado alemão apresenta uma reconstituição de época formidável, com uma trilha sonora escolhida a dedo (repare na abertura empolgante ao som de Major Tom, do Peter Schilling, que estourou na Alemanha nos anos 80), com uma direção de arte que foge um pouco do padrão das séries norte-americanas à la HBO. Apesar da tensão, o tom geral da narrativa é leve e vivaz, de curiosidade até, apropriado para descrever a transição do soldado do regime socialista para o capitalismo, explorando com inteligência as contradições dessa mudança.
A abordagem dessa época delicada da diplomacia internacional, realizada em Deutschland 83, difere um pouco da visão da também excelente The Americans (FX). Já renovada para a quarta temporada (prevista para 2016), a série retrata a vida de um casal de espiões russos que se passa por uma família de classe média nos subúrbios de Washington na década de 80. Entre uma missão e outra, a soldo da KGB, a dupla se vê às voltas com outras missões um tanto quanto triviais — mas nem por isso menos difíceis — como educar os filhos, relacionar-se com os vizinhos, e por aí vai.
Num tom abaixo e mais sombrio do que sua contrapartida alemã, o seriado da FX estrelado por Keri Russell e Matthew Rhys transcende os comentários políticos — que dão a tônica nas narrativas sobre espiões — para abordar temas como intimidade e identidade dentro da sociedade norte-americana, tão fraturada quanto a geopolítica daquele período.
O que não se pode negar, apesar das diferenças de abordagem entre os dois seriados a partir de um mesmo tema, é a complementaridade de ambos — o primeiro apostando na jornada de amadurecimento de seu personagem ao passo que o segundo concentra sua atenção na vida ambivalente do casal espião. Com uma estética decantada, fruto de um distanciamento histórico cada vez maior, não é de se surpreender que programas de TV, depois de mais de duas décadas, passem a dar mais atenção aos anos 80, explorando sua forte polarização ideológica e seus desdobramentos na vida social. Mas se os 80 são os novos 60 para a indústria cultural — para além dos revivals e “festas ploc” — só o tempo dirá.

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