TER, 11/08/2015 - 11:25
Jornal GGN - Pesquisa feita pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) mostra que os médicos cubanos que vieram trabalhar no programa Mais Médicos receberam, em média, a nota 9 (de uma máxima de 10) pelo atendimento no país. 55% dos entrevistados deram a nota máxima para o programa, enquanto 77% afirmam que tiveram boa comunicação e 87% elogiaram a atenção e qualidade do atendimento.
A pesquisa foi realizada entre novembro e dezembro de 2014, e entrevistou 14 mil pessoas em 700 municípios do Brasil.
Do UOL
Carlos Madeiro
No consultório da médica cubana Alba Marina Hernandez, na pequena Craíbas, no semiárido de Alagoas, o paciente que chega para ser atendido percebe logo uma diferença: a cadeira reservada a ele está ao lado da doutora e não separada por uma mesa. "Quero a cadeira perto de mim porque é melhor, eu quero tocar na pessoa, olhar no olho, de perto. O paciente sente mais confiança. A medicina é humana, é importante ter essa relação mais próxima", afirma.
O atendimento mais próximo é uma das marcas implantadas pelos médicos cubanos. Há dois anos no Brasil, eles ganharam carisma e a confiança de grande parte da população. Segundo uma pesquisa recente feita pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que entrevistou 14 mil pessoas em 700 municípios do país entre novembro e dezembro de 2014, os médicos cubanos receberam, em média, a nota 9 (de uma escala de 10) pelo atendimento. 55% dos entrevistados deram nota máxima ao programa. Outros 77% garantiram que tiveram boa comunicação e 87% elogiaram a atenção e qualidade do atendimento ao paciente.
O mesmo cenário é visto em Girau do Ponciano, também no semiárido de Alagoas. O município foi um dos primeiros a receber os médicos cubanos do programa Mais Médicos, em setembro de 2013.
No posto de saúde onde a médica Madelyn Guerra Sanchez trabalha, a procura é maior que de outras unidades da cidade. "As pessoas vêm à procura o atendimento dela, não querem mais os brasileiros. Os brasileiros sempre saem mais cedo, faltam ao trabalho. Ela, não. Examina sempre, atende com mais proximidade. É diferente", conta Celiane Ferreira Gomes, técnica de enfermagem da unidade.
Inicialmente, Sanchez foi enviada a Traipu, também em Alagoas, mas teve problemas e acabou deixando a cidade para ir até Girau do Ponciano, onde "se encontrou" no Brasil. "Quando cheguei lá [em Traipu], muitos me disseram que nunca receberam visita de um médico, muitos tinham problemas acumulados. Aos poucos as pessoas foram nos procurando e fomos resolvendo. Aqui também está sendo muito exitoso", disse.
A médica conta que deixou Cuba quando seu filho tinha um ano e oito meses. Em novembro, ela deve deixar o país em definitivo para voltar a cuidar do filho. Diz que terá boas lembranças do Brasil, mas se recorda das dificuldades que passou logo ao chegar.
"Tentaram nos desacreditar pela língua, mas não conseguiram. Sabíamos que a língua no começo seria um desafio, principalmente com os idosos. Mas contamos com o apoio muito grande da equipe de saúde e hoje conseguimos nos comunicar. Acho que vencemos, e somos um médico a mais aqui", afirma.
Para a médica Idalis Rivero, que atua na comunidade rural de Folha Miúda, em Craíbas, a vinda ao Brasil é tratada como missão. Ela deixou a filha de 14 anos e o marido professor em Cuba. "Claro que a escolha de vir tem o lado financeiro, mas mais que isso: lá, desde cedo, somos ensinados a ajudar as pessoas. Vim por isso", diz.
"Nunca tivemos dúvidas de que iríamos fazer um trabalho bem feito. A medicina é a mesma em todo lugar, e na América os problemas são parecidos. Em vez de tantos questionamentos à nossa capacidade, a sociedade médica daqui deveria se preocupar em fazer valer o código de ética, de ajudar mais as pessoas. Aqui se pensa demais em dinheiro", afirma o médico Angel Luis Martinez. O médico divide com o primo Alexeis Farinas a missão de atender à população do distrito de Canafístula do Cipriano - pertencente a Girau do Ponciano e onde moram 6 mil pessoas.
Alexeis analisa que a saúde pública brasileira tem diferenças marcantes do sistema cubano.
"Falta acessibilidade. Aqui se tem excelentes equipamentos, que Cuba, por ser pobre, não tem. Mas de que adianta ter se as pessoas não têm acesso sempre ao médico? Aqui a acessibilidade à saúde é muito difícil para quem não tem dinheiro. Lá, não é assim: todos têm acesso rápido e gratuito", revela.
Pacientes e gestores elogiam
Segundo o Ministério da Saúde, 11.429 médicos cubanos atuam hoje no país. Desde de que começaram a chegar, 56 desistiram e retornaram. O tempo de permanência previsto para esses profissionais no país é de três anos.
Durante a visita a cinco pontos de trabalho dos cubanos, no semiárido alagoano, todos os pacientes ouvidos elogiaram muito os serviços. "O trabalho dela é ótimo. Antes sofríamos bastante com a falta de médicos, que iam embora cedo, não atendiam bem. Ela dá mais atenção, e todo mundo gosta", conta Poliana Menezes da Silva, 27.
A gestante Karleane Alécio Santos, 35, está fazendo o pré-natal com a médica Madelyn Sanchez. "Ela é muito boa, entendo tudo que ele fala, é muito atenciosa. Não tenho do que reclamar", diz.
CFM discorda
Na avaliação do presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), Carlos Vital, faltou planejamento para que a chegada dos médicos estrangeiros trouxesse maior assistência à população de áreas de difícil fixação de profissionais. "Houve uma diminuição das consultas médicas em 25% dos municípios cadastrados e uma distribuição sem prioridade às áreas de pouca ou nenhuma assistência", disse.
Segundo Vital, uma auditoria do TCU (Tribunal de Contas da União) apontou que os cubanos passaram a ocupar o lugar dos brasileiros. "Em 49% dos primeiros locais atendidos pelo Programa com a chegada dos bolsistas houve a dispensa de médicos anteriormente contratados. Por isso, em torno de um ano, tais localidades tinham menos profissionais cadastrados na rede pública", afirmou.
Outro questionamento do CFM é quanto à qualidade do serviço prestado pelos profissionais. "As referências de maior gravidade surgiram quando 17,7% dos 'supervisionados' admitiram que a falta de conhecimento dos protocolos clínicos conturbou os diagnósticos e terapêuticas e quando 50,3% desses profissionais revelaram ter entrado em contato com o supervisor para dirimir dúvidas sobre o atendimento", avalia.
O CFM alegou ainda que 10% dos supervisores acompanhavam mais de dez participantes e outros 10% tinham carga de atividades acima de 81 horas semanais. O Conselho denunciou também que 95 profissionais foram inclusos após serem reprovadas por não atingirem nota mínima de língua portuguesa e de saúde.
"Em síntese, as conclusões do Tribunal, aliadas às recentes denúncias da imprensa de que o Governo brasileiro teria manipulado o Programa em sua concepção para beneficiar Cuba, determinam a urgente necessidade de revisão dessa estratégia", conclui.
Vital ainda refuta à tese de que os médicos brasileiros se negam a trabalhar em áreas remotas. "Os médicos brasileiros estão dispostos e interessados em ocupar as áreas de baixa cobertura assistencial, "Está provado que – quando há estímulo - o médico brasileiro está pronto e disposto a atuar em todas as localidades, sem distinção", concluiu.
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