quarta-feira, 30 de setembro de 2015

De volta para o controle de câmbio, por André Araújo

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O Jornal de todos Brasis
Por André Araújo
DE VOLTA PARA O CONTROLE DE CÂMBIO - O mecanismo de conversão de moedas conhecido como Plano Real, implantado em 1994, executou uma equação de troca gráfica da moeda circulante sem no entanto reformar as causas anteriores que geraram o processo inflacionário. Em 1995 foi iniciado um longo ciclo de internacionalização financeira da economia brasileira, com a desmontagem de um sistema de controle de câmbio que de diferentes formas existia a partir de 1931 e fortaleceu-se especialmente entre 1950 e 1970. Hoje, com o regime de câmbio flutuante, a economia brasileira está inteiramente internacionalizada com completa liberdade da conta capitais e nesse modelo está vulnerável a uma crise de grandes dimensões no setor externo da economia que por reflexo trava o setor doméstico.
Há no Brasil um volme em torno de US$700 bilhões de investimento estrangeiro direto registrado e o País tem uma dívida externa pública e privada em torno de US$500 bilhões, portanto há um passivo externo de US$1,2 trilhões no Brasil.
As reservas de US$370 bilhões não são suficientes para enfrentar uma fuga de capitais se boa parte do investimento externo solicitar repatriamento e cumulativamente atender ao serviço da dívida externa, além de garantir as importações necessárias ao abastecimento do País. Há também uma enorme conta de serviços não financeiros a pagar todo ano, como royalties, fretes, turismo, ensino, missões de paz da ONU, embaixadas, serviços de saúde.
As regras do Fundo Monetário Internacional (aqui) preveem o controle de cambio quando necessário. Os demais países do BRICS, Rússia, China, Índia e África do Sul não internacionalizaram sua economia financeira como o Brasil.
A China internacionalizou sua economia produtiva, mas não a financeira em grande escala. O Brasil é portanto o mais vulnerável dos BRICS porque mantém aberta a porta de entrada e saída de capitais mas com a degradação do rating do País a tendência é haver mais saídas do que entradas, abrindo-se uma zona de alto risco no lado cambial.
A internacionalização financeira não foi boa para a economia brasileira. O País perdeu metade de seu parque industrial, a participação da indústria no PIB de 1995 a 2014 caiu de 21% para 10% do PIB, grande parte dos investimentos diretos de capital estrangeiro não agregou capacidade produtiva nova, foi utilizado para compra de empresas existentes, especialmente no setor de serviços. Faculdades, hoje o maior grupo de ensino superior, com mais de um milhão de alunos é de controle estrangeiro, redes de restaurantes, só uma empresa tem 300 no Brasil, escolas, hospitais, planos de saude, um dos maiores negócios do mundo em 2013 foi a compra da AMIL pela United Health por US$5 bilhões, empresas de turismo (CVC), redes de farmácia (Onofre), empresas de construção de apartamentos (Brooksfield), de prédios comerciais (Tishman Speyer), de administração de prédios (Cushman & Wakefield), de seguros, lojas de especialidades (Tok & Stok), concessionárias de automoveis, negócios que eram nacionais foram internacionalizados, com os antigos donos recebendo altos valores que em grande parte foram para fora do País, criando-se então aqui nova base para remessas de dividendos e lucros sem nenhuma capacidade nova.
Setores tradicionalmente brasileiros como açúcar e álcool já estão sendo comprados por estrangeiros, já com 30% de participação e crescendo a todo ano. Por outro lado, tradings estrangeiras dominam o agronegócio brasileiro, financiando, fornecendo insumos e comercializando a produção de forma avassaladora. Mudanças de legislação estão no Congresso para aumentar participação estrangeira em aviação comercial e compra de terras.
Todo esse processo de internacionalização financeira fez parte do Plano Real e com esse processo criou-se toda uma grande comunidade de executivos, economistas e advogados brasileiros umbelicalmente ligados ao capital e aos interesses estrangeiros, do qual são dependentes e a quem defendem ideologicamente.
É por causa dessa internacionalização, maior no Brasil do que em qualquer outro dos BRICS, que a taxa de juros básica não pode baixar e ficando no patamar dos mais altos do mundo, estrangula a economia brasileira porque o empresário nacional não consegue se financiar a taxas duas ou três vezes maiores que a SELIC, enquanto as empresas estrangeiras se financiam com suas matrizes ou com bancos de seus países a taxas de 3% ao ano.
A internacionalização financeira não foi seguida por nenhum dos tigres asiáticos, nem Índia ou China, enquanto o Brasil tornou-se refém dessa internacionalização, o que estrangula a economia e a impede de crescer.
A saída para diminuir o risco de uma fuga de capitais que pode ocorrer em situações de economia frágil é restabelecer um sistema de controle de câmbio na conta capitais. No comércio exterior a liberdade cambial tem que ser mantida por conta dos acordos da OMC, MAS é possível haver um controle legítimo que foi abolido pela prevalência a partir do Governo Collor relativamente a quantidades, preços, qualidade e adequação de importações e exportações.
O comércio exterior brasileiro é hoje um gigantesco campo de fraudes de super e subfaturamento, servindo em boa parte para lavagem de dinheiro e exportação ilícita de capitais com sonegação fiscal. O Brasil já teve um dos mais sofisticados sistemas de controle de comércio exterior (a CACEX), substituido hoje pelo DECEX, que não tem uma fração da experiência e capilaridade da antiga CACEX.
Com o controle de câmbio será possivel baixar os juros básicos e forçar a baixa de juros de todo o sistema bancário, que em termos reais nunca foi tão alto na História do Brasil, nos tempos de inflação o juro real era infinitamente menor e com isso o Brasil cresceu em todo o periodo inflacionário, especialmente na indústria, a taxas das maiores do mundo.
A população e a economia produtiva brasileira, que é a que dá empregos, nada ganharam com a internacionalização financeira, ao contrário. Ganharam todavia um importante núcleo de profissionais ligados a esse processo e que hoje são os grandes críticos e pessimistas da economia não ligada a essa internacionalização, esses profissionais maximizam os defeitos reais da economia produtiva e da operação governamental e não se preocupam com os problemas que a internacionalização da economia produziu para o conjunto da população brasileira, a maior das quais é a necessidade de manter altas taxas de juros, o que acaba por prejudicar todo o conjunto da economia e também os cidadãos que se endividam em cartões de crédito, empréstimos parcelados e compras a crédito.
Uma reavaliação da política econômica brasileira deve passar pela revisão do papel da internacionalização da economia financeira, onde uma agência de rating passa a ter uma importância que jamais teve antes numa economia mais robusta do que hoje no Brasil dos anos 50, 60 e 70, onde, apesar de alguma inflação havia pleno emprego e grande crescimento industrial, social e de infra estrutura, esses foram anos em que foi erguida a maior parte da infra estrutura que existe hoje no Brasil.
O manejo do controle de câmbio é uma arte onde o Brasil tem grande expertise, pode ser executado de modo soft e civilizado através de estruturas que ainda existem no Banco Central, como a FIRCE (Fiscalização e Registro de Capitais Estrangeiros).
A centralização e controle de câmbio conviveu no Brasil com grande volume de investimentos estrangeiros PRODUTIVOS chegando e aqui se implantando sem maiores problemas com esse controle, com o qual conviviam perfeitamente. Havendo grande mercado, as empresas estrangeiras se adaptam a qualquer regime cambial organizado, como foi sempre o do Brasil, desde a SUMOC até a FIRCE, organismos com pessoal altamente qualificado, eficientes e respeitados, numa época em que o Brasil encorpou sua economia com maiores defesas do que hoje.

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