SEX, 25/09/2015 - 17:39
O primeiro passo para não se deixar atingir pelo tiroteio do câmbio é entender o momento atual.
Há dois tipos de crise cambial: a efetiva e a de expectativas.
A efetiva leva em conta os fundamentos da economia e a gravidade do quadro político e econômico. É quando há a fuga de dólares. Os investidores passam a vender seus dólares para retirá-los do país, pressionando as cotações. As empresas não conseguem dólares para quitar ou rolar seus financiamentos.
A crise de expectativas é mais branda. Não há risco de calote ou inadimplência, mas uma tensão política. Como, por exemplo, o jogo atual em relação ao pacote fiscal e à crise política.
Como não é estrutural, não depende do fluxo de entradas e saídas de dólar, mas unicamente do exercício de comprar ou vender dólares internamente.
É o caso atual em que a maioria das empresas tem seus passivos em dólares cobertos por operações de hedge bancadas pelo Banco Central.
Os dois tipos de crise exigem estratégias diversas dos especuladores.
A estratégia nas crises estruturais
Nas crises estruturais, há risco efetivo de fuga de dólares provocando moratórias ou calotes.
Os investidores profissionais percebem que a crise é estrutural e que só haverá reequilíbrio com uma desvalorização cambial.
O que eles planejam então é o seguinte:
1. Compram dólares no começo da escalada e remetem para fora.
2. Aguardam a alta bater no pico.
3. Quando bate no pico, há um impacto sobre a inflação. O Banco Central aumenta a Selic então, como reação à inflação e para atrair dólares.
4. Os investidores trazem rapidamente os dólares de volta, vendendo na alta. Recolhem os reais e aplicam em renda fixa. Depois, ganham com os juros e ganham com a queda no valor do dólar. Tudo sem risco porque, com a desvalorização cambial, o balanço de pagamentos volta a se reequilibrar.
Exemplo simples:
1. Quando o dólar bate em R$ 4,00, o investidor traz US$ 100 milhões, converte em R$ 400 milhões e aplica em uma Selic a 14,5%.
2. Um ano depois, os R$ 400 milhões, a 14,5%, estarão em R$ 458 milhões. Supondo que o dólar volte para R$ 3,00, os R$ 458 milhões equivalerão a US$ 152,7 milhões, ou uma rentabilidade de 52,7% em um ano.
As estratégias nas crises de expectativa
Nas crises de expectativa – como a atual – o jogo é mais simples.
Os especuladores se concentram em episódios pontuais – por exemplo, a avaliação das agências de risco, ou o embate pelas reformas fiscais, ou a guerra pelo impeachment.
Os especuladores ajudam a incendiar o mercado com toda sorte de boatos, que a imprensa se encarrega de propagar. Os profissionais dispõem de assessoria que os ajuda a separar os fatos e a deixar de lado a espuma e entender os momentos de gatilho: ou seja, os fatos políticos que reduzirão (ou aumentarão) a volatilidade da crise.
Sabem, por exemplo, que a crise atual tem data marcada, com vários episódios pontuais que provocarão a queda do dólar. Por exemplo:
1. Aprovação do pacote fiscal e da CPMF.
2. Realinhamento da base de apoio político de Dilma.
3. Uma reforma ministerial politicamente bem-sucedida.
Nesse caso, o dólar voltaria para perto dos R$ 3,50.
O segundo cenário com que o mercado trabalha é o de queda de Dilma. Nesse caso, haveria um período maior de nervosismo, devido às dúvidas com a transição.
O dólar de paridade e faces da especulação
Em nenhum país do mundo comparam-se valores nominais de moedas em períodos diferentes. Um dólar em 1890 valia muitas vezes mais do que um dólar em 1990, que por sua vez valia mais que um dólar em 2015 porque houve aumentos de preços no período e, consequentemente, perdas de valor do dólar. O mesmo vale para o real de junho de 1994, de abril de 2004 e de agora.
Quando se discute o câmbio – isto é, a relação entre moedas de mais de um país – tem que se pegar o valor das moedas ao longo dos tempos, a inflação interna de cada país para, então, poder comparar o câmbio em diversos períodos.
Tem mais ainda. O câmbio serve para definir as relações comerciais entre países. Como o Brasil comercializa com vários países e blocos econômicos – e não apenas com países na zona de influência do dólar – o Banco Central calcula mensalmente um índice chamado de taxa de equivalência de câmbio. No cálculo entram os valores das moedas e da inflação em cada bloco de países.
Com as contas corretas, o comportamento do real – frente a essas moedas – foi o seguinte, em todo o período do real.
Ou, em números.
Em reais de equivalência, em setembro de 2001 o dólar bateu em R$ 4,09. Em outubro chegou a R$ 5,13. Em fevereiro de 2003 estava em R$ 4,80, ou seja 20% a mais do que agora.
Não significa que o movimento atual do dólar seja insignificante. Significa apenas que o câmbio passou por esses estresses em outras oportunidades e o tal do mundo não se acabou.
Os vários tipos de crise cambial
Entendido o conceito de câmbio de paridade, e de crises, vamos às características das crises atuais.
No segundo semestre de 1998 – período eleitoral – o país estava tecnicamente quebrado. Houve enorme fuga de capitais. A desvalorização cambial foi contida por um empréstimo do FMI que garantiu o câmbio até as eleições, para os especuladores poderem sair relativamente ilesos do país.
Em 2002 houve movimento semelhante, devido aos primeiros soluços da crise internacional e, também, às barbeiragens cometidas pelo Banco Central de Armínio Fraga,
Foi um problema grave, porque os bancos estrangeiros estancaram completamente suas linhas de crédito, cabendo ao Banco do Brasil captar no mercado internacional para suprir o mercado interno. E ainda havia as dúvidas sobre o novo governo que chegava. Nessa época, também houve fuga de dólares. Ou seja, foi um momento imensamente mais nervoso e volátil que o atual.
Em 2008, caminhava-se para outra crise externa devido à política de apreciação cambial de Henrique Meirelles. O que evitou o país, na época, foi a crise internacional.
Recomendações ao investidor
Nesses momentos de tiroteio, não se fie nas notícias dos jornais. Somente os profissionais saberão separar factoides de fatos concretos.
A única informação que interessa no jornal é a quantidade de manchetes terroristas sobre o dólar. Deixe para quitar seus compromissos em dólar quando sentir que o terrorismo está amainando e que está reduzindo a volatilidade do dólar.
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