São Paulo - "A Alemanha é o país que nunca pagou suas dívidas. Ela não tem moral para dar lição em outras nações".
A frase é de Thomas Piketty, o economista francês que virou sensação mundial com o best-seller "Capital no Século XXI", sobre o aumento da desigualdade no mundo.
As declarações estão em uma entrevista publicada no jornal alemão Die Zeit ontem, antes da divulgação do resultado do referendo na Grécia (veja a tradução para o inglês).

Os gregos acabaram rejeitando os termos de um novo acordo de resgate com a Europa, o que pode acelerar a saída do país da zona do euro. Os mercados estão reagindo negativamente e o ministro de Finanças do país renunciou para facilitar novas negociações.
Paralelos
Piketty diz que a solução exigida pela Alemanha para a Grécia - acumular superávits para pagar a dívida lenta e gradualmente - pode até funcionar, mas é custosa e dolorosa.
A solução mais eficiente foi, ironicamente, o que permitiu a Alemanha se reerguer após a Segunda Guerra Mundial: uma combinação de reestruturação, perdão, inflação e novos impostos. Entre 1945 e 1955, a dívida alemã foi de 200% para 20% do PIB.
Na semana passada, sob protestos dos europeus, o próprio FMI divulgou um estudo mostrando que não há saída viável para a Grécia sem alguma reestruturação da dívida, ponto repetido frequentemente por seu primeiro-ministro.
"A história da dívida pública é cheia de ironia. Ela raramente segue nossas ideias de ordem e justiça", diz Piketty. Não é a primeira vez que ele opina sobre o assunto: em maio, ele já havia apontado a ironia histórica da situação.
Perguntado se o trauma das guerras não seria incomparável com o cenário atual, ele nota que a queda de mais de 25% do PIB que a Grécia sofreu nos últimos 5 anos é parecido com o que França e Alemanha experimentaram entre 1929 e 1935.
"A geração mais nova de gregos não carrega mais responsabilidade pelos erros dos seus mais velhos do que a geração mais nova de alemães nos anos 50 e 60. Precisamos olhar em frente", diz Piketty.
Piketty sugere uma conferência para reestruturar a dívida de vários países da Europa, não só da Grécia. Depois disso, seria criada uma nova instituição europeia composta por legisladores de todos os países e que tivesse o papel de determinar um limite para os déficits como forma a impedir mais endividamento.
"Se começarmos a chutar estados, então a crise de confiança no qual a zona do euro se encontra agora vai só piorar. Os mercados financeiros vão imediatamente se voltar contra o próximo país. Seria o início de um longo e arrastado período de agonia", diz Piketty.
E conclui: "Aqueles que querem perseguir a Grécia para fora da zona do euro vão acabar na lixeira da história".