QUI, 09/07/2015 - 13:55
Por João Villaverde
Nova voz do pensamento desenvolvimentista, a economista Laura Carvalho, professora da USP e doutora pela New School for Social Research, em Nova York (EUA), avalia que a crise econômica brasileira não será resolvida com mais ajustes duros, como sugere a equipe econômica e aposta a presidente Dilma Rousseff, mas com uma mudança profunda no regime fiscal e na meta de inflação. O leitor do blog que, diante do risco de contágio da crise na Grécia e com o mercado olhando com lupa os indicadores dos países emergentes, a equipe econômica do governo avalia que a melhor saída é continuar apertando gastos e elevando impostos. Nesta semana, em entrevista concedida pela presidente Dilma Rousseff ao jornal Folha de S. Paulo, ela confirmou isso, dizendo que novas medidas de ajuste fiscal Segundo Laura Carvalho, essa rota não é a mais indicada.
Laura é coautora do recémlançado livro “Indústria e Desenvolvimento Produtivo do Brasil“, feito em parceria com os economistas Nelson Marconi e Maurício Pinheiro, da FGV, e com o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa. Aliás, Laura e Nelson Barbosa dividem a mesma bagagem acadêmica: ambos fizeram graduação e mestrado na UFRJ e doutorado na New School, grandes pólos do pensamento desenvolvimentista no Brasil e nos Estados Unidos, respectivamente.
“A meta fiscal deste ano claramente não será cumprida, mesmo depois de todos os esforços até aqui, que envolveram fortes cortes de investimentos públicos, além do aumento de alguns impostos e da restrição de benefícios trabalhistas e previdenciários. Agora o governo deve reduzir a meta, mas isso não resolve o problema estrutural“, disse Laura, em entrevista ao blog. Segundo ela, o governo Dilma Rousseff deveria aproveitar a recessão instalada no País para reformar o regime fiscal.
De acordo com a economista, o governo deveria introduzir um regime de metas fiscais em que o volume do superávit primário, isto é, a economia de recursos públicos voltada ao pagamento dos juros da dívida pública, é ajustado ao ciclo econômico. Ou seja, caso o País atravesse uma recessão, como ocorre agora, a meta fiscal pode ser administrada de acordo com as circunstâncias, sem constituir uma camisa de força. Hoje, por exemplo, a meta fiscal de 2015 fixada em lei é de R$ 66,3 bilhões, o equivalente a 1,1% do PIB. Todo os especialistas em contas públicas – e integrantes do próprio governo – sabem que, no melhor dos casos, o governo atingirá um esforço equivalente a 0,6% do PIB, quase metade da meta. Mas para não descumprir a lei orçamentária, o governo precisa antes alterar a lei no Congresso Nacional… por isso, Laura sustenta um novo regime, com metas ajustadas ao ciclo e que contem também com “bandas”, parecido com a inflação, cuja meta é de 4,5%, mas com uma banda que estabelece um piso de 2,5% e um teto de 6,5%, permitindo um mínimo de margem de manobra para o governo.
“Apesar de todo o ajuste que foi conduzido no primeiro semestre, a confiança dos empresários e dos consumidores continuou caindo. É hora do governo aumentar o investimento público, e não cortálo, como fez até aqui. Mais investimentos vão sinalizar que haverá uma melhora da economia“, disse Laura, para quem esse aumento de gastos com investimentos pode ser financiado com o aumento de impostos sobre a renda e sobre a herança, como inclusive parte do governo e o próprio partido da presidente, o PT, defende.
A professora da USP entende que o atual patamar das metas fiscais deste ano e do próximo “impõe” ao governo o caminho das manobras contábeis e das “pedaladas fiscais”, combinadas com a busca incessante de receitas extraordinárias. “Este foi um caminho que deu errado, mas como chegar em uma meta fiscal tão alta vivendo uma recessão? Não acho que o governo deve recorrer a manobras, isso é péssimo para a credibilidade da política econômica. A questão central está em mudar o regime fiscal e estabelecer novas regras do jogo“, disse.
O exemplo recente da Grécia paira sobre os demais países emergentes, avalia a economista. Desde 2010, a Grécia conduziu um forte ajuste na economia, cortando gastos públicos e elevando impostos, direcionando a maior parte das receitas do Estado para o pagamento dos juros de empréstimos feitos pelo banco central da União Europeia e pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). Mesmo com todo o esforço, a economia grega não parou de cair, em todos os anos entre 2010 e 2014.
“Essas medidas de ajuste fiscal em geral assumem como pressuposto que um grande corte de gastos públicos vai melhorar os indicadores de dívida pública e, assim, a situação geral. A evidência grega mostra que, a depender do quanto você corta, o impacto que terá sobre a economia é de aprofundamento da recessão, o que piora ainda mais a arrecadação e, assim, dificulta ainda mais o esforço fiscal, levando a um quadro que se retroalimenta“, disse a economista.
Segundo Laura, as reformas na política econômica brasileira deveriam atingir também o regime de meta de inflação, que, tal qual o superávit primário, foi introduzido em 1999 e faz parte do “tripé macroeconômico”, que é completado com o câmbio flutuante.
O mercado financeiro estima que a inflação deve fechar o ano de 2015 com um avanço próximo a 9%, o maior em 12 anos. No esforço para reduzir a alta de preços, o Banco Central (BC) vem elevando a taxa básica de juros há quase dois anos. Hoje, a Selic, o juro básico, está em 13,75% ao ano e o mercado projeta novos aumentos. Para Laura Carvalho, no entanto, essa política do BC reforça o ajuste fiscal ao “inibir” os investimentos privados, sem ter efeito preciso sobre os preços.
“O próprio BC registra em seus relatórios e atas que a inflação está alta pela correção dos preços controlados e pelo efeito do câmbio. Com recessão, a demanda caiu. Então como que continua subindo juros para controlar aumento de preços que não estão reagindo a demanda?“, questiona.
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