SEG, 01/06/2015 - 12:00
Por Percival Maricato
A FÓRMULA DA DIREiTA PARA ACABAR COM A CORRUPÇÃO: VOTANDO A FAVOR DO FINANCIAMENTO DAS CAMPANHAS ELEITORAIS PELAS EMPREITEIRAS E BANCOS
Todas as análises mais respeitáveis da corrupção no sistema eleitoral atual concluem que a principal causa está no financiamento de campanhas por empresas privadas. A mesma empresa ou banco doa a vários políticos e partidos, alguns por identificação ideológica, outros porque querem estar próximo do poder. Alguma perspectiva de poder sempre é necessário, afinal, é investimento, tem que se pensar no retorno.
Como se percebeu no Lava Jato, empresas que tem relacionamento íntimo com obras, concessões, financiamento estatal, que mais precisam da tolerância e compreensão dos políticos, especialmente no posicionamento destes em projetos de lei, são as que mais investem. Quando se descobre corrupção, os partidos explicam que as doações foram legais. De fato, formalmente foram legais. Até o PT se defendeu dessa forma, às vezes dizendo que todos os partidos recebem doações ou que a corrupção existe desde 1500. Até tem razão, mas quem imaginava décadas atrás que estas seriam as explicações para os relacionamentos suspeitos envolvendo o Partido dos Trabalhadores? O mensalão foi algo parecido: havia partidos vendendo o voto, então decidiu-se pela compra dos que estavam a venda, por uma boa causa: aprovação de projetos como o SIMPLES, reforma da previdência etc. Os fins justificavam os meios. Ninguém do PT enfiou dinheiro no bolso, mas...
A mídia, sabendo da fragilidade dessas explicações, bateu o tempo todo, há anos não fala em outra coisa. Corrupção é coisa feia, é preciso acabar com ela etc. Com ajuda fundamental do PT, desgastou-o, tremendamente.
Tivemos recentemente a votação na Câmara para proibir ou permitir o financiamento de campanha por empresas privadas. Era a grande oportunidade de moralizar o processo eleitoral. O PSDB votou 46 x 2 e o DEM 20 X 0 para permitir esse conluio. O PT tenta se redimir, 62 x 0, mas contra o financiamento por empresas. Se voltar a fazer isso constantemente, quem sabe recupere parte do prestígio que teve até algum tempo atrás.
A mídia até que noticiou o resultado da votação, en passant, uma notícia a mais em meio a tantas outras. No entanto, ao contrário da Folha, nem no Estadão, nem na Globo ou demais TVs, nem uma única notícia sobre como votaram os partidos, sobre a incoerência dos partidos mais à direita que há anos ocupam espaços nobres com catilinárias contra a corrupção. A empreiteiras e bancos que preparem os cheques para as próximas eleições. Os opositores se calam, a mídia nada pergunta sobre motivações do voto. Quando muito alguém diz que é só para os partidos, mas PSDB e DEM votaram em bloco também pelo financiamento de candidatos por empresas privadas.
Ainda resta a esperança de que os parlamentares aprovem algum projeto de lei que proíba as doadoras de terem qualquer tipo de contrato ou relacionamento negocial com o governo, fazerem obras, receberem permissões, concessões etc, na gestão seguinte à da doação. Com isso demonstrariam que o dinheiro foi feito ao partido donatário, de forma desinteressada. Alguém acredita nisso?
Há uma última barreira a essa torpeza fora do Congresso é o STF. Há uma ação judicial pela qual se tenta declarar inconstitucional esse tipo de financiamento no STF. Até agora, seis ministros votaram pela proibição, nenhum a favor. Mesmo que todos doravante votem contra, a proibição seria vitorisoa. E já deveria ter sido assim há muito tempo. Acontece que Gilmar Mendes pediu vistas há mais de um ano e engavetou os autos, esperando pela aprovação definitiva desse tipo de financiamento no Congresso (ainda tem que ser aprovada no Senado e sancionada pela Presidente). Muito provavelmente, votará depois, se aprovado e sancionado o projeto de lei, afirmando que a ação perdeu o objeto. No entanto, os que votaram contra essa imoralidade o fizeram por ela deturpar a manifestação democrática, cláusula pétrea da Constituição. Há alguns anos passado a mídia apoiou o STF nesse tipo de interpretação, quando cassou deputados petistas do mensalão, prerrogativa que poderia ser interpretada como sendo da Câmara de Deputados. Como se comportará nesta outra polêmica, a ser instalada? Como dizer que há igualdade entre o voto de um trabalhador que ganha um ou alguns salários mínimos, contra o banqueiro que pode doar R$ 50 milhões? Nos EUA a Suprema Corte já aprovou a legalidade das doações sem limites; julgaram os juízes, a maioria nomeada pelos bushs, que isso não deturpa a igualdade no processo eleitoral. Há outra ação iniciada pelo PSOL, contra esperteza de Eduardo Cunha. Ele propôs em votação uma proposta que permitia a doação por empresas, tanto para o candidato como para o partido. Perdeu e então propôs outra no dia seguinte, como se fosse diferente, prevendo apenas financiamento a partidos. Desta vez, após manobrar pelo fisiologismo, conseguiu aprovação. Evidente no entanto que o financiamento para partidos já tinha sido derrotada na votação anterior e não poderia ser posta em votação novamente neste ano.
Como se vê, a conquista da liberdade, da democracia, da igualdade, da justiça, da decência, continua sendo uma corrida de obstáculos a serem vencidos. Mas que pode acontecer de mais interessante na vida do que lutar contra obstáculos desse teor, se possível vencê-los, e por fim tão nobre como obter uma verdadeira democracia.
Percival Maricato
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